
A presidente da Santa Casa de Campo Grande, Alir Terra Lima, afirmou nesta segunda-feira (22) que a paralisação dos enfermeiros e demais trabalhadores do hospital é resultado de uma “crise anunciada”, provocada por um desequilíbrio financeiro que se arrasta desde 2022. Segundo ela, o impasse nos repasses do poder público comprometeu a capacidade da instituição de honrar com o pagamento do 13º salário de cerca de 3 mil funcionários.
“A casa precisa rodar, nós lidamos com pacientes. Sempre devemos preservar a vida”, afirmou Alir Terra Lima, ao comentar as dificuldades enfrentadas pela administração. A presidente destacou que a situação é de conhecimento do Ministério Público, que acompanha o caso e já ajuizou uma ação civil pública para discutir o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato com a Santa Casa.
Crise prolongada e falta de equilíbrio financeiro - A dirigente explicou que, desde 2022, a Santa Casa busca uma revisão contratual que assegure equilíbrio econômico ao hospital, o que permitiria um planejamento financeiro mais sólido, incluindo a reserva anual para o pagamento do 13º salário. “O que nós precisamos é o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, para que durante o ano possamos fazer a gestão adequada e garantir esse pagamento em novembro”, disse.
Representantes da Santa Casa e do Ministério Público discutem saídas para o impasse financeiro que afeta o hospital desde 2022 - (Foto: Rafael Rodrigues)
De acordo com Alir, o governo do Estado não tem obrigação legal de pagar a chamada “13ª parcela da contratualização”, mas vinha concedendo o aporte em anos anteriores. “O governo deveria deixar de dar essa décima terceira parcela? Sim, desde que o contrato tenha o seu equilíbrio econômico-financeiro. Hoje, ele não tem”, pontuou.
Com cerca de R$ 14 milhões em 13º salários atrasados e um déficit mensal que gira em torno de R$ 12 milhões, a Santa Casa tenta agora um novo empréstimo bancário para amenizar a crise. “Não é fácil, porque quando os bancos recebem a documentação e veem o desequilíbrio do contrato, eles não querem conceder o crédito”, relatou Alir.
A presidente explicou que a instituição já contraiu empréstimos em crises anteriores, o que ampliou o endividamento. “Hoje o arrasto deste período é de cerca de R$ 100 milhões. Quando eu tenho que escolher entre pagar uma dívida e comprar insumos para salvar vidas, eu escolho o insumo e o remédio”, afirmou.
Segundo ela, parte das dívidas já é descontada automaticamente na fonte. “Temos cerca de R$ 6 milhões que já são abatidos mensalmente do valor repassado pelo governo federal”, completou.
A paralisação parcial dos profissionais impactou diretamente o funcionamento do hospital, que é o principal da rede de urgência e emergência de Mato Grosso do Sul. “Nós somos obrigados a receber todos os pacientes regulados, mas estamos com excesso de internações. Quando aumenta o número de pacientes, tudo aumenta: alimentação, lavagem de roupa, limpeza. Por isso, suspendemos tudo que era eletivo”, explicou a presidente.
Funcionários cruzam os braços em frente à Santa Casa de Campo Grande, que enfrenta greve por atraso no pagamento do 13º salário - (Foto: Rafael Rodrigues)
Apesar do cenário adverso, Alir Terra Lima ressaltou o comprometimento dos funcionários que continuam trabalhando. “A Santa Casa tem mais de 3 mil colaboradores, e mesmo em meio à crise, muitos permanecem porque sabem que estão aqui para salvar vidas”, declarou.
Negociações com o poder público - A dirigente afirmou que as tratativas com o Estado e o município seguem sob mediação do Ministério Público. “Estamos tendo reuniões com a Procuradoria-Geral de Justiça. Amanhã teremos outro encontro, às 9h. Há uma ação judicial em andamento, e buscamos resolver pelos meios legais”, disse.
Ela reforçou que o hospital não pode “obrigar o poder público a tomar uma decisão”, por se tratar de uma entidade filantrópica prestadora de serviços. “Da mesma forma que não é legal a ingerência dentro da Santa Casa, também não é legal a Santa Casa obrigar o governo ou o município a fazer algo. Por isso, recorremos ao Judiciário”, afirmou.
Sobre relatos de falta de insumos e estrutura precária, a presidente negou que haja desabastecimento ou problemas como falta de água. “Não é real que falte água na Santa Casa. Todos os bebedouros foram trocados recentemente. Também não faltam insumos essenciais. Suspendemos cirurgias eletivas justamente para garantir que não falte nada para os casos de urgência e emergência”, garantiu.
Ela disse ainda que o hospital criou um comitê de crise para monitorar estoques e racionalizar o uso dos materiais disponíveis. “A Santa Casa nunca deixou de atender ninguém. Temos cuidado e priorizado o insumo de quem corre risco de morte”, reforçou.
Atendimento na Santa Casa é mantido parcialmente; serviços eletivos foram suspensos para priorizar casos de urgência e emergência - (Foto: Rafael Rodrigues)
Do outro lado, os trabalhadores afirmam que não há previsão de retorno enquanto o 13º salário não for pago integralmente. “É uma falta de respeito com os profissionais da saúde. Trabalhamos o ano inteiro para cuidar de todos e, em dezembro, enfrentamos esse caos”, disse a técnica de enfermagem Alessandra Luz da Silva.
O presidente do Sindicato dos Profissionais da Radiologia (Sinterms), José Carrijo, declarou que a paralisação começou após reunião com a direção do hospital, na sexta-feira (20). “O pessoal quer receber o 13º. Se não pagar, a greve será permanente até que o problema seja resolvido”, afirmou.
“Preservar a vida está acima de tudo” - Em meio ao impasse, Alir Terra Lima reafirmou que, apesar da falta de recursos, a prioridade da Santa Casa continuará sendo o atendimento aos pacientes. “Entendemos que o direito de verba alimentar está acima de tudo, mas sempre devemos preservar a vida. Foi essa escolha que fizemos”, declarou.
A dirigente disse esperar que o impasse chegue a uma solução definitiva em 2025. “Estamos há três anos sem reajuste do contrato. Não queremos viver de crises pontuais. Queremos um equilíbrio justo para que a Santa Casa possa continuar salvando vidas”, concluiu.

