
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta terça-feira (9), às 9h, o julgamento de seis réus apontados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como integrantes do núcleo operacional da tentativa de golpe de Estado. Segundo a acusação, esse grupo — identificado como núcleo 2 — desempenhou papel estratégico ao fornecer suporte jurídico, logístico e de inteligência para ações destinadas a impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022.
A PGR afirma que os acusados atuaram em frentes paralelas para viabilizar o plano golpista. Entre elas, estaria o uso irregular da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para dificultar o deslocamento de eleitores em regiões favoráveis a Lula no segundo turno da eleição e a elaboração da chamada “minuta golpista”, documento que previa medidas de exceção destinadas a reverter o resultado das urnas.
O julgamento será conduzido pela Primeira Turma, composta por Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Flávio Dino, que preside o colegiado. Caberá aos ministros decidir entre absolver ou condenar os seis réus:
• Filipe Martins, ex-assessor especial de Bolsonaro;
• Marcelo Câmara, ex-assessor do então presidente;
• Mário Fernandes, general e ex-secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência;
• Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF;
• Fernando de Sousa Oliveira, ex-diretor de operações do Ministério da Justiça;
• Marília de Alencar, ex-subsecretária da mesma pasta.
Todos respondem por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
De acordo com a denúncia, o núcleo 2 funcionava como articulador das ações de outros grupos envolvidos. Um dos pontos centrais é o suposto papel do general Mário Fernandes na elaboração do plano denominado “Punhal Verde e Amarelo”, que previa o assassinato de Lula, de Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes, relator dos processos ligados ao 8 de Janeiro.
A investigação aponta que o documento foi impresso dentro do Palácio do Planalto e levado ao Palácio da Alvorada, onde teria sido apresentado ao então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Outro destaque é o envolvimento do ex-diretor da PRF Silvinei Vasques. Segundo a PGR, ele teria utilizado a estrutura da corporação para retardar e impedir o deslocamento de eleitores, especialmente no Nordeste, no dia do segundo turno. As ações incluíram operações de fiscalização consideradas abusivas, dirigidas majoritariamente a regiões onde Lula liderava com ampla margem.
O julgamento ocorrerá em quatro datas: 9, 10, 16 e 17 de dezembro. As sessões dos dias 9 e 16 terão dois turnos — das 9h às 12h e das 14h às 19h — enquanto as de 10 e 17 acontecerão apenas pela manhã, das 9h às 12h.
Os réus tiveram até 7 de outubro para apresentar alegações finais. Entretanto, as defesas de Filipe Martins e Marcelo Câmara perderam o prazo. Moraes considerou o atraso como litigância de má-fé e tentativa de paralisar o andamento processual, chegando a destituir os advogados e nomear a Defensoria Pública da União (DPU). Depois, voltou atrás e concedeu novo prazo, com as manifestações entregues no dia 11.
O clima de tensão entre o relator e alguns defensores se intensificou ao longo da tramitação. Moraes já havia discutido com o advogado de Martins em audiência realizada em julho. No domingo (7), negou o pedido para uso de slides na sustentação oral. Nesta segunda (8), rejeitou solicitação para que o ministro Luiz Fux participasse do julgamento, mesmo após sua transferência para a Segunda Turma.
Nas alegações finais, os advogados apresentaram pedidos de absolvição total e levantaram diversas questões preliminares. Entre os argumentos estão:
• impedimento de Moraes por suposta falta de imparcialidade;
• incompetência do STF para julgar os casos;
• nulidade da ação penal por cerceamento de defesa.
Essas teses, porém, já haviam sido rejeitadas anteriormente pela Primeira Turma em julgamentos relacionados a outros núcleos considerados centrais na trama da tentativa de golpe.
O núcleo 2 é o terceiro a ser analisado pelo STF. Até agora, 24 réus já foram condenados:
• oito do núcleo 1, integrado por Jair Bolsonaro;
• sete do núcleo 4;
• nove do núcleo 3, formado pelos chamados “kids pretos”, apontados como responsáveis pela execução violenta das ações.
A denúncia do núcleo 5, que envolve o comentarista Paulo Figueiredo — atualmente nos Estados Unidos — ainda aguarda análise.
O julgamento desta semana é considerado decisivo porque trata justamente da engrenagem que, segundo a PGR, conectava a estratégia intelectual do golpe à sua execução prática.
O caso coloca novamente o STF no centro das decisões relacionadas ao 8 de Janeiro. A avaliação de ministros é de que o julgamento dos núcleos envolvidos no planejamento do golpe tem peso simbólico e jurídico distinto dos julgamentos dos executores que invadiram as sedes dos Três Poderes.
Há expectativa de que as sessões sejam longas e marcadas por debates acalorados, dado o elevado número de crimes imputados e o volume de provas reunidas ao longo da investigação.


