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28 de outubro de 2025 - 17h08
JULGAMENTO NO STF

Defesas de Bolsonaro e aliados tentam reverter condenações no STF com base em voto isolado

Recursos apresentados ao Supremo rebatem decisões já firmadas e usam voto de Fux como base para futuras ações judiciais

28 outubro 2025 - 13h35Hugo Henud e Juliano Galisi
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro repetiu teses já rejeitadas durante o julgamento da ação penal por tentativa de golpe
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro repetiu teses já rejeitadas durante o julgamento da ação penal por tentativa de golpe - Foto: Wilton Junior/Estadão
Terça da Carne

As defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros réus condenados por tentativa de golpe de Estado apresentaram recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF) que extrapolam o escopo permitido nesta etapa do processo. Ao invés de se restringirem a esclarecer pontos omissos ou contraditórios do acórdão, os advogados voltaram a levantar teses já superadas e tentam utilizar o voto isolado do ministro Luiz Fux para sustentar pedidos de mudança no resultado do julgamento.

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Especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que, embora as chances de acolhimento desses recursos — embargos de declaração — sejam remotas, o objetivo das defesas é manter viva a possibilidade de novos recursos futuros, como embargos infringentes e revisões criminais.

Os embargos de declaração, por natureza, não permitem a reabertura do mérito da decisão, tampouco a alteração de seu resultado. No entanto, os advogados argumentam que o acórdão apresenta erros de fato e distorções nas provas.

Tese jurídica e manobra processual - A defesa de Jair Bolsonaro afirma que não há provas de que ele tenha determinado a elaboração da chamada “minuta do golpe” ou participado de qualquer reunião para planejar medidas inconstitucionais. Os advogados também questionam a dupla tipificação penal por golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, alegando que deveria haver absorção de um crime pelo outro — tese já rejeitada durante o julgamento.

Os recursos apresentados pelos demais réus seguem a mesma linha, contestando decisões já consolidadas no processo. O criminalista Renato Vieira analisa que os embargos foram usados para reintroduzir teses como cerceamento de defesa, suposta imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes e a ausência de provas diretas. “É como se transformassem esse recurso em uma espécie de apelação. São críticas ao julgado, mas que não cabem nos embargos”, afirmou.

Um dos principais elementos comuns entre os recursos é a citação ao voto divergente do ministro Luiz Fux, que absolveu parte dos réus e criticou pontos da acusação. Para os especialistas, a estratégia dos advogados é aproveitar esse voto isolado como argumento para embasar futuros embargos infringentes ou até uma revisão criminal.

A defesa de Anderson Torres, por exemplo, classificou o voto de Fux como “técnico”, “profundo” e com “aderência à prova dos autos”. Já os advogados de Bolsonaro afirmaram que o voto do ministro foi o único a reconhecer “ilegalidades” na ação penal. O mesmo argumento foi usado por outras defesas, com exceção de Walter Braga Netto, que não mencionou Fux em seu recurso.

Teses repetidas e tentativas de reinterpretação - Além de destacar o voto divergente, os advogados voltaram a alegar que o alto volume de documentos (o chamado document dump) teria prejudicado o direito de defesa — argumento que já havia sido rejeitado. Também contestaram a credibilidade do delator Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e afirmaram que suas declarações teriam sido usadas de forma distorcida no julgamento.

A defesa de Braga Netto alegou omissões em relação ao contexto da delação de Mauro Cid, enquanto Augusto Heleno voltou a afirmar que já estava afastado do governo quando os fatos ocorreram. Anderson Torres pediu a correção de trechos do acórdão sobre sua fala em uma live de 2021, e Paulo Sérgio Nogueira questionou a interpretação do uso da expressão “linha de contato com o inimigo”, dita em reunião ministerial.

A defesa de Alexandre Ramagem insistiu que a ação penal por organização criminosa deveria ter sido suspensa, tese também já analisada anteriormente. O ex-diretor da Abin alega que não havia provas de seu comando sobre a “Abin paralela”.

A aposta das defesas agora recai sobre os embargos infringentes, que permitem a revisão do julgamento em caso de divergência entre os ministros. O problema, segundo o entendimento atual do STF, é que essa ferramenta só é válida quando há ao menos dois votos pela absolvição — e apenas Luiz Fux divergiu nos casos mais relevantes.

Para o professor de Direito Marcelo Crespo, da ESPM, essa interpretação é excessivamente restritiva. “O próprio regimento do STF não fixa número mínimo de votos divergentes. As defesas usarão o voto de Fux como base para insistir nesse recurso”, argumenta.

A revisão criminal, outro possível caminho, pode ser ajuizada após o trânsito em julgado, quando não houver mais recursos disponíveis. Renato Vieira avalia que as defesas já estão preparando terreno para essa possibilidade. “O voto de Fux traz elementos que podem ser úteis tanto em embargos infringentes quanto em uma futura revisão.”

A análise dos embargos de declaração será feita pela Primeira Turma do STF a partir de 7 de novembro. A tendência é de que os recursos sejam rejeitados, mas o debate jurídico está longe de terminar.

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