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Prefeitura de Campo Grande propõe mudanças na cobrança do IPTU
Na última sexta-feira (29), a Câmara Municipal de Campo Grande realizou uma audiência pública para debater uma mudança na legislação que pode afetar diretamente o bolso da população. A discussão girou em torno do projeto de lei complementar nº 7/2025, , enviado pela Prefeitura no dia 18 do mesmo mês. A proposta altera o Código Tributário Municipal, em especial as regras relacionadas ao cálculo do IPTU.

O ponto mais sensível do projeto é o artigo 148-D, que permite ao Poder Executivo atualizar, todos os anos, a base de cálculo do IPTU — ou seja, o valor venal dos imóveis — sem necessidade de aprovação do Legislativo. Bastaria um relatório técnico publicado no Diário Oficial para que a correção passasse a valer.
Trecho do Projeto de Lei Complementar nº 7/2025, enviado pela Prefeitura de Campo Grande à Câmara Municipal, que inclui o artigo 148-D sobre a atualização anual da base de cálculo do IPTU por ato do Executivo.
(clique aqui e leia a íntegra)
Para especialistas e representantes do setor imobiliário, a medida pode criar um mecanismo permanente de aumento do imposto, sem transparência nem debate público. “Se o Executivo pode atualizar por decreto, o contribuinte fica sem garantia de debate”, afirmou Renato Perez, da Associação Brasileira do Mercado Imobiliário (ABMI), durante a audiência.
Perez integra a Comissão para Assuntos Parlamentares da entidade e participou da reunião representando o setor. Ele fez questão de destacar que a crítica não é contra eventuais reajustes, mas contra a forma proposta. “Temos plena convicção de que esse não é o espírito da atual gestão municipal, que sempre demonstrou compromisso com a população. Apenas a atualização monetária baseada em índice oficial de inflação pode ser feita por ato do Executivo. Todo e qualquer aumento real de IPTU, portanto, deve obrigatoriamente passar pelo crivo dessa Casa de leis”, afirmou.
Renato Perez durante pronunciamento na tribuna da Câmara Municipal de Campo Grande.
Ele acrescentou que a separação entre correção monetária e aumento real precisa ficar clara. “A Câmara precisa ser ouvida. Os contribuintes também precisam ser ouvidos”, disse. Um estudo apresentado na audiência revelou distorções de até 1.500% nos valores cobrados entre imóveis semelhantes em bairros diferentes da cidade. O dado acendeu o alerta para a complexidade da questão tributária municipal.
Apesar de o Executivo defender que a mudança serve apenas para atualizar os valores dos imóveis conforme a inflação — prática comum em outros tributos —, a proposta não especifica essa limitação. O texto abre margem para interpretações que, segundo Perez, “autorizariam o Executivo a majorar o IPTU por decreto, sem a necessidade de aprovação do Poder Legislativo”.
O artigo, conforme apresentado, também levanta dúvidas jurídicas. O princípio da legalidade tributária, previsto na Constituição, determina que qualquer criação ou aumento de tributo só pode ser feito por meio de lei. O Supremo Tribunal Federal já reforçou esse entendimento em decisões anteriores, deixando claro que correções só podem ser feitas por índices oficiais e critérios objetivos.
Além do aspecto jurídico, há a preocupação institucional. “Um sistema tributário com esse grau de distorção não pode ser ajustado por decreto, mas sim com a participação popular, com o crivo do Legislativo e com o apoio da sociedade civil organizada”, argumentou Perez.
Assista ao momento em que Renato Perez, da ABMI, faz alerta sobre o IPTU durante audiência na Câmara de Campo Grande:
A audiência pública também trouxe outros pontos levantados por moradores e técnicos: cobrança de IPTU em áreas de preservação ambiental, terrenos sem habite-se e propriedades com perfil rural ainda incluídas na malha urbana. Esses casos reforçam a necessidade de revisão técnica cuidadosa, mas com controle social.
Para o setor da construção civil, a estabilidade nas regras é essencial. “Quando tratado com equilíbrio, respeito e previsibilidade, [o setor] gera empregos, renda, habitação e desenvolvimento urbano sustentável. Quando pressionado por insegurança jurídica, recua. E, com ele, recuam os investimentos, os empregos, o crescimento da cidade e a própria arrecadação municipal”, concluiu Perez.
Sem consenso ao fim da audiência, o projeto segue em tramitação. Os vereadores deverão decidir se mantêm ou alteram o artigo 148-D. Enquanto isso, especialistas, entidades e moradores acompanham o desenrolar da proposta, atentos ao que pode representar uma mudança silenciosa, porém impactante, na forma como os impostos urbanos são decididos em Campo Grande.
