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POLÍTICA

Juristas apontam quebra de decoro e possível prevaricação em ocupação de mesas da Câmara e do Senado

Especialistas divergem sobre gravidade do ato, mas concordam que protesto extrapolou prerrogativas parlamentares

9 agosto 2025 - 06h15
Após dois dias de obstrução protagonizada pela oposição na Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Hugo Motta, retomou a cadeira de presidente
Após dois dias de obstrução protagonizada pela oposição na Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Hugo Motta, retomou a cadeira de presidente - (Foto: Wilton Júnior/Estadão)

A ocupação das mesas diretoras da Câmara e do Senado por parlamentares de oposição nesta semana configurou quebra de decoro e pode caracterizar o crime de prevaricação, segundo juristas ouvidos pela Agência Brasil. O ato, que durou dois dias e impediu o funcionamento do Legislativo por mais de 30 horas, tinha como objetivo protestar contra a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro e pressionar pela votação da anistia aos condenados por tentativa de golpe de Estado, além do impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes.

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Para o professor de direito constitucional Henderson Fürst, a manifestação ultrapassou os limites da liberdade parlamentar. “Aquilo não foi um ato legítimo de atuação de um parlamentar no debate de ideias democráticas para o país. Pode-se considerar uma prevaricação. O crime é próprio de funcionário público, e parlamentares se enquadram nessa categoria. Eles atrasaram o exercício de suas obrigações por interesse particular ou de terceiros”, afirmou.

O artigo 5º do Código de Ética da Câmara define como contra o decoro “perturbar a ordem das sessões” ou reuniões de comissões.

Deputados e senadores de oposição chegaram a pernoitar nos plenários, impedindo a realização de sessões. O especialista em Direito Público e Eleitoral Flávio Henrique Costa Pereira reconhece que a pauta — mudanças legislativas — é legítima, mas afirma que impedir o funcionamento da Casa extrapola o papel de um parlamentar. “Não é legítimo fazer essa manifestação impedindo o livre exercício das atividades do Poder Legislativo. Da forma como fizeram, impediram que sessões ocorressem nos horários determinados.”

Pereira discorda da comparação feita por líderes governistas entre o ato e os ataques de 8 de janeiro de 2023, argumentando que não se tratou de um atentado à democracia.

A senadora Tereza Cristina (PP-MS), líder da bancada ruralista, defendeu a ação: “Às vezes você precisa, para ser ouvido, chamar atenção para alguma coisa. Ninguém aqui está feliz com essa situação, mas foi preciso fazer um gesto para que a gente fosse ouvido e esse diálogo fosse retomado.”

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), ameaçou aplicar suspensão cautelar de mandato de até seis meses a parlamentares que impeçam o funcionamento da Casa. PT, PSB e PSOL protocolaram representações no Conselho de Ética contra cinco deputados do PL envolvidos no ato.

Fürst lembra que cabe exclusivamente aos deputados decidir se houve ou não quebra de decoro, por meio do Conselho de Ética, e que a imunidade parlamentar não cobre esse tipo de ação.

Juristas também analisam as ações do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que, nos Estados Unidos, defende sanções contra autoridades do STF e apoia tarifas impostas pelo ex-presidente Donald Trump contra produtos brasileiros, condicionando o fim das medidas à aprovação da anistia aos condenados por tentativa de golpe.

Fürst aponta possível enquadramento no artigo 359-I do Código Penal, previsto na Lei de Defesa da Democracia (14.197/2021), que criminaliza negociar com governos estrangeiros para provocar atos típicos de guerra contra o país, incluindo estrangulamento financeiro.

Para Pereira, a conduta não se enquadra como atentado à democracia pela lei, mas pode configurar obstrução de processo judicial (Lei 12.850/2013) e quebra de decoro com possibilidade de cassação de mandato. “A ação dele é inconstitucional porque o dever do parlamentar é defender a Constituição. Ao pedir intervenção de um terceiro, ele submete a soberania nacional a um Estado estrangeiro.”

O PT apresentou pedido de cassação do mandato de Eduardo Bolsonaro. O deputado, que vive nos EUA, afirma ser alvo de perseguição política.

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