
Dois projetos de lei com foco no combate ao crime organizado avançam paralelamente no Congresso Nacional e acirraram o debate político em torno da segurança pública no Brasil. De um lado, o governo federal apresentou o chamado "PL antifacção", assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na última semana. Do outro, parlamentares da oposição, liderados pelo deputado Danilo Forte (União-CE), defendem o "PL antiterrorismo", que busca enquadrar facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) como organizações terroristas.
As duas propostas ganharam tração após a operação policial nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, que resultou na morte de 121 pessoas, levantando discussões sobre os limites da atuação policial e a gravidade das ações do crime organizado em territórios urbanos.
O projeto antiterrorismo, que seria votado nesta terça-feira (4) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, foi adiado para quarta-feira. Apesar de já contar com requerimento de urgência aprovado, o Partido Liberal pediu que a tramitação siga pela CCJ antes de ir ao plenário, para evitar contestações legais futuras.
A proposta atualiza a Lei Antiterrorismo e passa a considerar atos de facções criminosas e milícias como terrorismo, especialmente quando voltados à dominação territorial, intimidação coletiva, tráfico de drogas ou outras formas de controle armado. A pena prevista é de 12 a 30 anos de prisão, com possibilidade de aumento de até dois terços no caso de líderes ou comandantes de organizações criminosas.
A proposta conta com apoio de nomes como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que sugeriu a unificação de pontos dos dois projetos. Segundo ele, o objetivo é “fazer o melhor texto possível”, juntando elementos das propostas governista e da oposição. O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, que está licenciado do mandato de deputado federal, deve reassumir seu posto na Câmara para ser relator do projeto.
Por outro lado, o governo federal optou por um caminho alternativo com o "PL antifacção", que busca fortalecer o aparato legal para repressão ao crime organizado, sem usar o rótulo de “terrorismo”. O projeto altera diversas legislações existentes, incluindo o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Crimes Hediondos, a Lei de Prisão Temporária e a Lei de Execução Penal.
Entre as medidas propostas estão a criação de um novo tipo penal, chamado de “organização criminosa qualificada”, penas mais severas para líderes de facções e a criação de um Banco Nacional de Organizações Criminosas. A pena para quem integra organização criminosa sobe para 5 a 10 anos de prisão. Nos casos em que houver controle de território ou de atividades econômicas, o tempo de reclusão pode variar entre 8 e 15 anos.
A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), criticou publicamente a proposta da oposição, afirmando nas redes sociais que a medida abre caminho para sanções internacionais e intervenção estrangeira em território nacional. “Não conseguem esconder seu desejo de entregar o País ao estrangeiro, do mesmo jeito que Eduardo Bolsonaro e sua família de traidores da pátria fizeram com as tarifas e a Magnitsky”, escreveu no X (antigo Twitter).
A crítica do governo é que, ao rotular grupos internos como terroristas, o Brasil se expõe a interpretações jurídicas de outros países — como os Estados Unidos — que, por lei, têm mecanismos para aplicar sanções ou até realizar ações diretas contra grupos considerados terroristas, mesmo fora de seus territórios.
A expectativa é de que o embate entre os dois projetos continue nas próximas semanas, com tentativa de unificação ou disputa direta nas votações do plenário. A tensão entre garantir uma resposta mais rigorosa ao crime organizado e manter limites jurídicos para evitar riscos externos marca o centro do debate.

