
Aliados do governo no Congresso articulam uma manobra para adiar a votação do projeto de dosimetria das penas aplicadas aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. A proposta, que pode beneficiar diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), já foi aprovada na Câmara dos Deputados e agora está sob análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), afirmou que a intenção é pedir vistas — ou seja, mais tempo para análise — com o objetivo de empurrar a deliberação para 2026, o que na prática esvaziaria o debate e reduziria a pressão sobre o tema. “A proposta poderá ser deliberada, votada e aprovada ou não na semana que vem, porque sempre que se lê o relatório, naturalmente, há pedido de vistas”, disse o presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA).
Segundo Otto, o pedido pode ser concedido por mais de um dia, o que inviabilizaria a votação ainda em 2025, jogando a discussão para depois do recesso parlamentar. “Aí, não terá condição de se votar neste ano”, afirmou.
Enquanto o governo trabalha para postergar a análise, parlamentares da oposição e do centrão pressionam para votar o texto o quanto antes. A avaliação de lideranças do PL, do Republicanos e de outros partidos de direita e centro-direita é que a proposta aprovada na Câmara já representa um avanço significativo na tentativa de aliviar a situação jurídica de Bolsonaro.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), sinalizou que pretende pautar o texto ainda na próxima semana. Nos bastidores, o entendimento é que eventuais emendas ao projeto podem atrasar a tramitação, já que forçariam o retorno à Câmara, o que torna a estratégia do governo ainda mais eficaz para ganhar tempo.
A proposta que está em debate reduz a pena total de Bolsonaro de 27 anos e três meses para 20 anos. Mais do que isso: segundo o relator na Câmara, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), o tempo de prisão em regime fechado poderia cair para apenas dois anos e quatro meses.
O texto foi aprovado em uma votação na madrugada, poucos dias após o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) afirmar publicamente que existia "um preço" para ele desistir da candidatura presidencial em 2026. Esse preço, segundo ele, seria uma "anistia ampla" que tornasse seu pai novamente elegível. Antes da votação, Flávio se reuniu com lideranças do centrão.
Embora o projeto não atenda a toda a demanda de anistia, já é chamado por aliados de Bolsonaro de “anistia light” — uma versão enxuta, mas eficaz do que vinha sendo reivindicado nos bastidores.
No Senado, o relator do projeto é Esperidião Amin (PP-SC), que deve se reunir com Paulinho da Força ainda nesta semana para discutir o conteúdo aprovado na Câmara. Amin não descarta ajustes no texto, mas aliados de Bolsonaro temem que alterações atrasem ou dificultem a aprovação. A palavra de ordem é evitar riscos desnecessários.
Mesmo que oficialmente ainda defendam uma anistia ampla, senadores de direita admitem, reservadamente, que o atual projeto é suficiente. E, diante do impasse entre governistas e oposição, crescem as chances de a proposta virar palco de mais uma disputa política em meio ao início do calendário eleitoral de 2026.

