
As gigantes da tecnologia Google e Facebook entraram com recursos no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão que ampliou a responsabilidade das redes sociais por conteúdos ilícitos postados por usuários. As empresas questionam omissões, contradições e obscuridades do acórdão publicado na última semana, resultado do julgamento ocorrido em junho deste ano.
A decisão do STF considerou parcialmente inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que isenta as plataformas de responderem por danos gerados por conteúdo de terceiros. O entendimento dos ministros foi de que essa imunidade só se aplica em casos de crimes contra a honra, como injúria, calúnia e difamação. Em outros casos, como terrorismo, crimes sexuais e incentivo ao suicídio, prevalece o dever de cuidado e a obrigação de remoção imediata do conteúdo após notificação.
Empresas pedem clareza sobre início da aplicação das regras - No recurso apresentado, o Facebook argumenta que o acórdão falha ao não indicar a partir de quando a decisão começa a valer. “Isso deixa em aberto questões fundamentais sobre sua aplicabilidade a situações pretéritas já discutidas em processos em curso”, diz a empresa.
O Google também solicitou esclarecimentos e apontou um erro material na definição de termos técnicos, como o uso da palavra “chatbot” como sinônimo de redes artificiais de distribuição de conteúdo. A empresa explicou que chatbots simulam conversas humanas e não operam como mecanismos de disseminação de postagens em massa, como robôs automatizados.
Outro ponto criticado é a falta de detalhamento sobre como devem ser feitas as notificações extrajudiciais que obrigariam as plataformas a remover conteúdos. O Google alerta para o risco de uma “indústria de notificações”, o que poderia levar à judicialização em massa e à sobrecarga do sistema judiciário brasileiro.
Já o Facebook solicitou que o STF estabeleça um prazo de transição para implementar o chamado “dever de cuidado”, conceito que impõe medidas preventivas às plataformas para conter a circulação de conteúdos ilícitos graves.
Segundo a empresa, as novas obrigações são de “elevada complexidade técnica, jurídica e operacional” e, sem prazo para adaptação, geram insegurança jurídica.
Decisão pode impactar legislação futura - A decisão do STF é considerada estratégica pelo governo federal. Nos bastidores do Palácio do Planalto, há avaliação de que o acórdão preenche lacunas que seriam abordadas no projeto de lei dos Serviços Digitais, elaborado pelo Ministério da Justiça. O PL, que vem sendo chamado de sucessor do PL das Fake News, ainda não foi enviado ao Congresso, e a decisão do Supremo pode influenciar seu andamento ou até substituir sua necessidade em parte.
Com a publicação do acórdão, as empresas têm direito de apresentar embargos de declaração, recurso que busca esclarecer omissões ou ambiguidades em decisões da Corte. Agora, o Supremo deve analisar os questionamentos das big techs, enquanto o tema segue sendo acompanhado com atenção por especialistas em direito digital, autoridades públicas e setores da sociedade civil.

