
Um grupo formado por nove ex-ministros da Justiça divulgou nesta segunda-feira (21) um manifesto em defesa do Supremo Tribunal Federal (STF) e em repúdio às sanções impostas pelo governo dos Estados Unidos a oito magistrados da Corte e ao procurador-geral da República, Paulo Gonet. No documento, os ex-ministros denunciam o que classificam como uma tentativa de coação indevida e uma afronta à soberania nacional.

As medidas adotadas pela Casa Branca incluem o cancelamento dos vistos dos magistrados e seus familiares. A sanção veio após decisões recentes do ministro Alexandre de Moraes no âmbito da investigação sobre a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023, entre elas a imposição de tornozeleira eletrônica ao ex-presidente Jair Bolsonaro, além de restrições de circulação e comunicação.
Assinam o manifesto os ex-ministros Eugênio Aragão, José Carlos Dias, José Eduardo Cardozo, Miguel Reale Júnior, Milton Seligmann, Nelson Jobim, Raul Jungmann, Tarso Genro e Torquato Jardim.
Apoio ao Supremo e crítica direta ao governo Trump
No texto intitulado "Repúdio à invasão", os ex-titulares da Justiça acusam o governo norte-americano de ultrapassar os limites da diplomacia ao interferir diretamente em decisões do Poder Judiciário brasileiro. Segundo o grupo, a atitude representa “coação indevida” e busca intimidar o STF por contrariar interesses de grandes corporações americanas.
"Manifestamos, então, na condição de ex-ministros da Justiça e da Segurança Pública, nosso repúdio a esta intervenção abusiva e nossa solidariedade ao STF e aos seus ministros, vítimas de indevida coação, que visa a constrangê-los na sua liberdade de decisão", diz o documento.
Sanções impostas e o contexto da crise diplomática
As sanções dos EUA foram anunciadas na sexta-feira (18), pouco depois da decisão de Alexandre de Moraes que submeteu Bolsonaro a um rígido regime de monitoramento. A Casa Branca classificou a condução do caso como “perseguição política”, numa fala que ecoa a retórica do ex-presidente brasileiro e de seus apoiadores.
Os ex-ministros, no entanto, veem nas atitudes do governo Trump um ataque direto à soberania do Brasil. Para eles, a retaliação aos magistrados é uma tentativa clara de interferência externa num processo legal em curso.
"Se não bastasse a intromissão em julgamento, no qual se assegura a ampla defesa e o contraditório, o governo norte-americano promoveu perseguição a oito ministros do STF, cassando seus vistos, cassação extensiva aos seus parentes", reforça o texto.
Rejeição ao que chamam de ‘transtorno delirante’
Em tom severo, o manifesto faz críticas ao comportamento do governo Trump, que segundo os ex-ministros, revive uma postura arrogante da política externa americana. "Esta prepotência retorna, acentuadamente, no novo mandato do presidente Trump e ameaça a paz, a convivência entre países, o multilateralismo e a efetividade do auxílio às populações vulneráveis ao redor do mundo", afirmam.
Segundo eles, embora a iniciativa norte-americana possa parecer “risível” do ponto de vista jurídico, ela representa uma grave violação das normas internacionais e do princípio da autodeterminação dos povos.
Defesa do Estado democrático e da independência do Judiciário
O manifesto reforça o apoio à atuação do STF nos processos relacionados aos ataques antidemocráticos de janeiro de 2023 e afirma que os magistrados têm atuado dentro da legalidade e com respeito ao devido processo legal.
"Seria apenas risível esta pretensão de Trump e dos Estados Unidos de interferir no julgamento, sendo réus agentes políticos e um ex-presidente, que agiram contra a democracia, se não se revelasse uma afronta inadmissível à nossa soberania", diz um trecho do texto.
Articulação institucional contra pressões externas
A manifestação pública de ex-ministros da Justiça evidencia um raro alinhamento institucional em defesa do STF e de sua autonomia. Ao fim do documento, os signatários convocam a sociedade e os demais Poderes a se manterem vigilantes diante de qualquer tentativa de desestabilização da ordem democrática brasileira por forças estrangeiras.
"Em nome da defesa da soberania do Brasil, apresentamos nossa profunda solidariedade ao STF e aos seus membros", conclui o texto.
A medida dos Estados Unidos, que impôs restrições não apenas aos ministros como também a seus familiares, é vista por analistas como um movimento inédito nas relações diplomáticas entre Brasil e EUA. A resposta institucional dos ex-ministros acende o alerta para possíveis tensões futuras e reforça a necessidade de preservar os princípios da diplomacia e da independência entre os Poderes.
