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28 de novembro de 2025 - 16h00
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POLÍTICA

Cármen Lúcia denuncia racismo estrutural em voto sobre omissão do Estado

Ministra do Supremo utiliza versos de Emicida e Carolina Maria de Jesus para ilustrar desigualdades raciais no Brasil

28 novembro 2025 - 15h50Adriana Victorino
Ministra Cármen Lúcia citou versos de Emicida e Carolina Maria de Jesus em voto sobre racismo estrutural.
Ministra Cármen Lúcia citou versos de Emicida e Carolina Maria de Jesus em voto sobre racismo estrutural. - Foto: WILTON JUNIOR
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A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), apresentou nesta quinta-feira (27) um voto contundente na ação que discute a omissão do Estado brasileiro na garantia de direitos da população negra. Com referências marcantes da cultura brasileira, a magistrada fez duras críticas à persistência do racismo estrutural e da desigualdade racial no país.

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Ao iniciar sua manifestação, Cármen Lúcia citou a música Ismália, do rapper Emicida: “A felicidade do branco é plena; a felicidade do preto é quase”. Para a ministra, essa frase resume a realidade vivida por milhões de brasileiros. “Eu não espero viver num país em que a Constituição para o branco seja plena e para o negro seja quase. Eu quero uma constituição que seja plena igualmente para todas as pessoas”, afirmou.

O julgamento, que já conta com oito votos reconhecendo a violação sistêmica de direitos contra a população negra, será retomado em data ainda indefinida.

Constituição que não alcança todos - A ministra sustentou que o Brasil vive um “estado de coisas inconstitucional”, destacando que as políticas públicas adotadas até hoje são insuficientes para garantir igualdade real. “A insuficiência de todas as medidas e providências tomadas até aqui não revela superação do racismo histórico, de um racismo estrutural, sem resposta adequada”, afirmou.

Segundo a magistrada, os 37 anos da Constituição Federal ainda não foram suficientes para construir uma efetiva igualdade racial. “Não é possível continuar preterindo mais da metade da população brasileira por puro, grave, trágico racismo. É isso que nós temos”, declarou.

Ainda citando Emicida, a ministra relembrou os versos “80 tiros me lembram que há a pele alva e a pele alvo”, em referência à morte de pessoas negras por forças de segurança, como no emblemático caso do músico Evaldo Rosa, morto com 80 tiros disparados por militares do Exército no Rio de Janeiro, em 2019.

Esses episódios, na avaliação de Cármen, revelam uma “tragédia brasileira” enraizada em séculos de exclusão e violência contra a população negra. “Esses versos mostram a dor de uma sociedade que ainda não compreendeu a necessidade urgente de se transformar”, pontuou.

Vozes da literatura periférica - Cármen Lúcia também trouxe ao voto as palavras da escritora Carolina Maria de Jesus, ícone da literatura marginal. Citou o poema em que a autora fala de sua exclusão: “Não digam que sou da vida rebotalho, nem que fiquei à margem da vida. Digam que procurei trabalho, que sempre fui preterida”.

A ministra usou a citação para reforçar que a marginalização não é fruto do acaso, mas de um sistema social que ainda nega oportunidades com base na cor da pele. “Essa voz, da literatura periférica, ecoa uma realidade vivida por milhares de mulheres negras brasileiras.”

O que está em julgamento - A ação em discussão no STF trata de um suposto “estado de coisas inconstitucional” relacionado à falta de políticas públicas eficazes para combater o racismo e promover a igualdade racial. O julgamento foi iniciado com repercussão geral, ou seja, a decisão final deverá orientar tribunais de todo o país.

Com maioria formada, o Supremo já se encaminha para reconhecer que o Estado brasileiro tem falhado sistematicamente na promoção de igualdade racial. Ainda resta o voto de alguns ministros antes da conclusão do julgamento.

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