
O jornal The Washington Post, um dos veículos mais respeitados da imprensa dos Estados Unidos, publicou neste domingo (20) um artigo contundente sobre os desdobramentos da tensão política e econômica entre Brasil e EUA. Segundo a publicação, o que chamou de "bullying de Trump contra o Brasil" está produzindo efeitos contrários aos pretendidos: fortalece o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) politicamente e agrava ainda mais a situação judicial do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

A análise do jornal aponta que a recente imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros pelo governo americano acabou se transformando em uma “sorte inesperada” para o governo Lula. Segundo o texto, as medidas punitivas promovidas por Donald Trump, principal acionista da Trump Media e pré-candidato à presidência dos EUA, ajudaram a reverter o cenário político desfavorável ao petista.
"As pesquisas mostram um renascimento do apoio ao seu governo diante da intimidação americana provocada por Bolsonaro. As tarifas também prejudicaram os interesses das elites empresariais, que costumam ser os maiores defensores da oposição conservadora a Lula", afirmou o Washington Post.
Sanções como estratégia para pressionar o Judiciário
A reportagem destaca ainda que Trump tem se posicionado de forma clara contra o processo judicial que envolve Bolsonaro no Brasil, especialmente a ação em que o ex-presidente é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Segundo o jornal, a ofensiva comercial do governo americano teria como pano de fundo uma tentativa de deslegitimar a atuação do Judiciário brasileiro — esforço que, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), buscava influenciar o andamento do processo criminal.
A PGR argumentou que as barreiras comerciais impostas pelos EUA teriam como objetivo obstruir o curso normal da Justiça brasileira. A consequência foi um novo pedido de medidas cautelares contra Bolsonaro, que acabou sendo alvo de uma operação da Polícia Federal na última sexta-feira, 18. Desde então, o ex-presidente passou a ser monitorado por tornozeleira eletrônica, está proibido de manter contato com diplomatas e teve decretado o recolhimento domiciliar noturno.
Campanha de lobby de Eduardo Bolsonaro
Segundo o jornal americano, o endurecimento da relação entre os dois países também foi precedido por uma campanha de lobby articulada por Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente. Em março, o deputado afirmou publicamente que buscaria apoio de autoridades americanas para pressionar e sancionar ministros do STF.
Para o Washington Post, essa movimentação teria influenciado diretamente na decisão de Trump de impor tarifas, numa tentativa de demonstrar apoio político ao ex-aliado brasileiro. No entanto, ao invés de reforçar a posição de Bolsonaro, a medida aprofundou sua crise política e jurídica, e fortaleceu seu adversário direto.
Economia brasileira resiliente às pressões
O texto do jornal também destaca a capacidade da economia brasileira de resistir às sanções americanas, ao contrário de outros países da América Latina que já cederam a pressões semelhantes vindas de Washington.
"As ameaças tarifárias de Trump obrigaram outros países da região a se curvarem a Washington. Mas a economia do Brasil é maior e mais diversificada do que a de seus vizinhos, e seu líder (Lula) percebeu uma oportunidade na crise", diz o artigo.
Segundo a análise, Lula soube aproveitar o episódio para reforçar seu discurso de soberania e independência econômica, tanto no cenário interno quanto nas articulações diplomáticas internacionais. A retórica nacionalista e o realinhamento de alianças comerciais têm ajudado a recompor sua base de apoio, inclusive entre setores antes distantes do governo.
Reeleição e redesenho geopolítico
Com a crise provocada pelas tarifas americanas e a exposição pública da tentativa de influência política de Trump, o artigo aponta que Lula pode sair fortalecido politicamente no caminho rumo à reeleição em 2026. A crise, que inicialmente parecia mais um obstáculo em um momento delicado, foi transformada em uma vantagem estratégica pelo governo, segundo o jornal.
Por outro lado, Bolsonaro vê seu cenário se estreitar: além do cerco jurídico no Brasil, passa agora a lidar com a repercussão internacional negativa de seu envolvimento indireto nas tensões entre os dois países. A atuação de Trump, com quem Bolsonaro mantém uma relação próxima desde seu mandato, acabou prejudicando mais do que ajudando.
