
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta uma crise interna sobre como reagir à megaoperação da Polícia Militar do Rio de Janeiro, que deixou ao menos 121 mortos no Complexo da Penha e do Alemão. Diante da repercussão negativa nas redes sociais e da ofensiva liderada por governadores da direita, o Planalto passou a tratar o tema com urgência e tenta frear a narrativa de que o PT defende "direitos humanos de bandidos".
A resposta inicial do governo foi marcada por desencontros. Enquanto alguns ministros criticaram publicamente a operação, outros pediram cautela. A situação se agravou com declarações contraditórias entre o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, sobre o envolvimento prévio do governo federal na ação policial.
Para tentar retomar a narrativa, Lula assinou na sexta-feira (1º) um projeto de lei com foco no combate às facções criminosas. O texto propõe penas mais rígidas para líderes do crime organizado, infiltração de agentes em empresas ligadas à lavagem de dinheiro e a criação do Banco Nacional de Organizações Criminosas. O presidente pediu urgência na tramitação ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Cenário de guerra nos complexos do Alemão e da Penha - (Foto: Pedro Kirilos/Pedro Kirilos)
Internamente, o Planalto também colocou em operação uma força-tarefa de comunicação para evidenciar as ações do governo no combate ao crime organizado. A Secretaria de Comunicação (Secom) passou a destacar que o trabalho da Polícia Federal vai além do combate ao tráfico — seu foco seria sufocar financeiramente a cúpula das facções.
Até o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reforçou o discurso: “Parte grande dos devedores contumazes está envolvida com o crime organizado no Rio. Precisamos chegar nos ‘CEOs’ dessas estruturas criminosas”, disse.
A tragédia reacendeu uma discussão antiga no núcleo político petista: a separação entre os ministérios da Justiça e da Segurança Pública. O ex-ministro José Dirceu voltou a defender a criação de uma pasta exclusiva para segurança, ideia já ventilada por Geraldo Alckmin antes de assumir a vice-presidência. A proposta, no entanto, não encontra consenso dentro do governo.
O Planalto também se mobiliza para rebater críticas de governadores conservadores como Tarcísio de Freitas (SP), Ronaldo Caiado (GO) e Romeu Zema (MG), que criaram o “Consórcio da Paz” e passaram a liderar um discurso público sobre segurança. A movimentação, segundo Lula, tem caráter eleitoral e visa desviar o foco da condenação de Jair Bolsonaro no Supremo.
Lideranças petistas reconhecem que o partido tem dificuldade histórica em lidar com o tema da segurança pública. Em estados como a Bahia, governada pelo PT há quase duas décadas, os indicadores de violência permanecem entre os mais altos do país.
Para o cientista político Felipe Nunes, diretor da Quaest, a segurança será o tema central das eleições de 2026. “Em 1994 era a inflação. Em 2002, a desigualdade. Em 2018, a corrupção. Em 2022, a economia. Agora, o foco é a violência”, avaliou.
O presidente do PT, Edinho Silva, também defendeu uma abordagem mais estruturada e humanizada. “Sem uma proposta de segurança pública consistente, o discurso do autoritarismo vai prevalecer. É preciso investir em tecnologia, reinserção social e cuidado com jovens em situação de risco”, declarou.

