
A Polícia Federal prendeu, em Guarulhos, na Grande São Paulo, um homem apontado como líder de uma quadrilha que usava um esquema sofisticado para enviar cocaína à Europa a partir do Aeroporto Internacional de Cumbica. Renato Machado, de 30 anos, foi localizado na última terça-feira (22), em uma cobertura no município. A informação foi divulgada pelo programa Fantástico, da TV Globo, no último domingo (27).

Renato é acusado de chefiar a logística de um grupo criminoso que trocava etiquetas de bagagens de passageiros sem envolvimento com o tráfico. Assim, malas com cocaína eram enviadas para países como Alemanha, França e Portugal, em voos comerciais. O esquema já vinha sendo investigado há dois anos pela Polícia Federal.
De acordo com o delegado Felipe Lavareda, responsável pela investigação, Renato não era funcionário do aeroporto, mas tinha influência sobre as escalas de trabalho e se comunicava constantemente com os operadores do esquema. “Ele não vinha aqui. Não era ex-funcionário daqui. Mas tinha contatos. É ele que formava as escalas daquele dia para aquele voo, para aquela localidade que a droga ia”, explicou.
Um dos casos que chamou atenção da opinião pública ocorreu em março de 2023, quando duas mulheres goianas, Kátyna Baía e Jeanne Paolini, foram presas por engano na Alemanha, acusadas de tráfico internacional. Elas passaram 38 dias detidas, até que imagens das câmeras de segurança do aeroporto comprovaram que suas malas haviam sido adulteradas durante a conexão em Guarulhos.
“Falamos de imediato que aquelas malas não eram nossas”, disseram à reportagem do Fantástico, em áudio.
Essas imagens foram fundamentais para provar a inocência das passageiras. Elas mostram dois funcionários do aeroporto, em uma área restrita e monitorada, manipulando discretamente as malas de Kátyna e Jeanne. Em seguida, essas malas foram substituídas por outras — pretas e rosas — que teriam sido levadas até o terminal por duas mulheres não identificadas, que deixaram o local sem embarcar.
Segundo a PF, a quadrilha utilizava esse mesmo modus operandi para enviar cocaína também à França e a Portugal. Em outubro de 2022, por exemplo, uma mulher de Goiânia teve a mala trocada durante um voo com destino a Paris, mas não chegou a ser detida.
Investigação aponta estrutura organizada e compartimentada - De acordo com os investigadores, o grupo tinha uma hierarquia bem definida. Os executores, que manipulavam as malas dentro do aeroporto, muitas vezes nem conheciam os nomes dos líderes. “Às vezes o pessoal que atua aqui de fato, pondo a mão na massa, não conhece quem é o líder. Só sabem por nome. Tem uma pessoa no meio e é bem compartimentado”, explicou Lavareda.
Pedro Venâncio, um dos funcionários flagrados nas câmeras trocando etiquetas de bagagem, foi preso cerca de um mês após o caso das brasileiras. Ele confessou em depoimento que receberia R$ 10 mil para participar da operação. “Eu sabia que era uma mala de conexão, era uma mala que vem de um lugar e vai para outro. Não pararia apenas em um aeroporto”, afirmou.
A defesa de Venâncio tenta, agora, reduzir a pena alegando que a confissão do réu não foi considerada de forma adequada no processo judicial.
As investigações também revelaram o perfil agressivo do suposto líder da quadrilha. Mensagens encontradas no celular de Renato Machado indicam ameaças contra possíveis delatores do esquema. Em uma das conversas, ele escreve: “Achamos o safado que estava caguetando nós, mano”; em outra, diz: “Esse cara já era, virou finado” e “Tá um cadáver ambulante”.
Há ainda suspeitas de que o grupo tenha ligação com o Primeiro Comando da Capital (PCC), embora a Polícia Federal ainda não tenha confirmado oficialmente essa conexão.
A defesa de Renato Machado afirma que as acusações contra ele se baseiam em suposições e conexões não comprovadas. Segundo os advogados ouvidos pela TV Globo, não há flagrante ou evidência direta da participação do investigado nos crimes, e medidas judiciais serão tomadas.
O jornal Estadão tentou contato com os advogados de Renato, mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.
O delegado Lavareda detalhou que Renato operava à distância, mas tomava decisões cruciais para a logística da quadrilha. "Ele trata tudo de longe, dando as ordens. Às vezes, pode até ir lá fazer o pagamento, dar carona, mas ele não toca na droga", afirmou. Mesmo sem estar presente no aeroporto, era ele quem organizava as escalas de trabalho para garantir a execução do plano sem levantar suspeitas.
O trabalho de investigação da PF se concentrou na análise de vídeos, conversas telefônicas, mensagens de texto e movimentações financeiras. Com essas informações, foi possível montar um organograma detalhado da estrutura criminosa, identificar os envolvidos e, gradualmente, efetuar as prisões dos responsáveis.
