
Em um cenário dominado por caudalosos rios, terras de fronteira e a crescente sombra do crime organizado, o Monitor Parnaíba, o mais antigo navio de guerra em operação no mundo, ainda corta as águas do Rio Paraguai com a mesma dignidade de seus primeiros dias. Na Operação Ágata Oeste 2024, ele não é apenas mais uma peça no jogo da segurança nacional, mas um símbolo de um passado que persiste, teimosamente, em se fazer útil na era da tecnologia de ponta.

O Parnaíba, lançado ao mar em 1937 e modernizado repetidas vezes ao longo de seus 86 anos, foi convocado para a linha de frente de uma missão que envolve Forças Armadas, polícias e órgãos de segurança pública. Seu papel? Navegar as águas fronteiriças de Mato Grosso do Sul, onde o tráfico de drogas, armas e outras atividades ilícitas se esgueiram pelas margens e rios. A missão do navio, hoje equipado com modernos sistemas de navegação e armamento, é assegurar que essas rotas, frequentemente invisíveis à vigilância em terra, estejam sob controle.
Mas o Parnaíba carrega mais do que armas ou tecnologia. Ele transporta história — a história de um Brasil que se esforçou para construir sua própria força naval, e de uma embarcação que sobreviveu a guerras e décadas de transformações globais. E agora, como uma espécie de monumento flutuante, ele continua a patrulhar.
Originalmente lançado em 1937, o Monitor Parnaíba combina passado e presente ao integrar a Operação Ágata Oeste, dedicada a proteger as fronteiras brasileiras.
Uma embarcação de outra era, em um país que pouco mudou - O Parnaíba foi projetado em uma época em que o Brasil ainda sonhava com uma indústria naval robusta, capaz de competir com o mundo. Lançado do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, ele foi concebido para operar em rios de baixa profundidade, exatamente como os que serpenteiam a fronteira pantaneira do país. Suas missões, ao longo dos anos, variaram de patrulhamento fluvial durante a Segunda Guerra Mundial até as atuais operações de fronteira, como a Ágata Oeste.
Hoje, em vez de vigiar comboios no Atlântico, o veterano tem uma tarefa mais sutil, mas igualmente crucial: evitar que o Rio Paraguai se transforme em uma via aberta para o contrabando e o crime organizado. Nas águas calmas e aparentemente tranquilas do Pantanal, o navio se movimenta com a serenidade de quem conhece seu caminho há muito tempo. Não há pressa, mas também não há descanso.
Embora tenha nascido em uma era diferente, o Parnaíba foi equipado ao longo dos anos com sistemas de navegação e armamento modernos, adaptando-se aos desafios contemporâneos.
Uma operação multifacetada contra o invisível - A Operação Ágata Oeste, na qual o Parnaíba está engajado, vai além da simples patrulha de rios. É um esforço conjunto, envolvendo mais de 2 mil militares, aviões, drones e veículos em uma tentativa coordenada de fechar o cerco às atividades criminosas que cruzam as fronteiras por terra, ar e água. O crime organizado, que há tempos utiliza as rotas fluviais como corredores de contrabando, não enfrenta apenas soldados e navios, mas também a tecnologia: satélites, drones de última geração e sistemas de vigilância avançada foram mobilizados para monitorar uma vasta e remota área.
Nos primeiros 12 dias da operação, mais de R$ 100 milhões em perdas foram infligidos ao crime organizado, com apreensões que vão desde drogas até mercadorias contrabandeadas. A missão é árdua e, muitas vezes, invisível para a maioria da população. Para os moradores das áreas afetadas, no entanto, a presença de operações militares e patrulhas navais como a do Parnaíba traz uma sensação de que o Estado, por vezes ausente, está finalmente olhando para essa fronteira.
O peso do tempo e da tradição - Mas o que faz do Monitor Parnaíba tão fascinante não é apenas sua eficiência ou capacidade operativa. É o que ele representa: um elo direto com um Brasil que, na década de 1930, olhava para o futuro com ambição e esperança. O Parnaíba é uma relíquia de uma época em que o país buscava afirmar sua soberania no cenário global, mas, ao mesmo tempo, ele é parte de um presente onde velhas estruturas ainda encontram um lugar em meio a tecnologias de ponta.
O Parnaíba na Baía de Guanabara ao final da Segunda Guerra Mundial
Foto: DPHDM (Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha)
Em um certo sentido, o navio carrega as marcas do tempo, mas se recusa a se tornar obsoleto. Ele foi reformado, modernizado e equipado para continuar cumprindo seu papel em uma era digital, onde drones sobrevoam silenciosamente e satélites capturam imagens detalhadas das florestas e rios da fronteira. O Parnaíba não disputa a liderança em termos de inovação — ele é o ancião que, pacientemente, continua fazendo o que sempre fez: vigiar, navegar e, de alguma forma, conectar passado e presente.
Entre o passado e o futuro, um Brasil à deriva? A presença do Parnaíba na Operação Ágata Oeste talvez simbolize mais do que uma estratégia de segurança. Ele é um reflexo de como o Brasil, muitas vezes, se movimenta no tempo. Moderno e antigo, eficiente e arcaico, o país equilibra-se entre o desejo de inovar e a persistência em manter o que já tem.
Projetado para operar em rios de baixa profundidade, como o Rio Paraguai, o Parnaíba continua a ser uma peça-chave na estratégia militar brasileira.
Em águas que cortam as fronteiras, o Monitor Parnaíba segue seu caminho, carregando em seus conveses não apenas soldados e armas, mas também uma memória coletiva. Para o Comandante Robson de Freitas Reis, que hoje lidera o navio, o Parnaíba é mais do que uma ferramenta de trabalho: “Ele traz consigo uma herança cultural e histórica, mas com capacidades operativas modernizadas. É um exemplo de como podemos, sim, preservar o passado, sem perder de vista o futuro.”
Enquanto o Brasil se moderniza tecnologicamente, o Monitor Parnaíba simboliza a persistência do passado na defesa das fronteiras, mostrando que tradição e inovação podem coexistir.
Talvez, no fim, o Monitor Parnaíba seja uma metáfora perfeita para o Brasil: um país que carrega o peso de sua história, enquanto tenta navegar por mares cada vez mais desafiadores e incertos.
