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RESILIÊNCIA DA CAIMAN

O fogo e o futuro do Pantanal: como a Caiman planeja proteger a biodiversidade diante das queimadas

Roberto Klabin lidera esforços para aumentar a resiliência da Fazenda Caiman após incêndio

15 setembro 2024 - 09h15Ricardo Eugenio
Uma árvore Ipê floresce em meio à vegetação queimada no Pantanal, evidenciando a força de recuperação da natureza após os incêndios na Fazenda Caiman.
Uma árvore Ipê floresce em meio à vegetação queimada no Pantanal, evidenciando a força de recuperação da natureza após os incêndios na Fazenda Caiman. - (Foto: Reprodução ; YouTube)

No vasto e alagado Pantanal, a Fazenda Caiman é um pedaço de resistência contra as transformações que vêm impactando uma das regiões mais biodiversas do mundo. No último mês, mais um incêndio devastador colocou em xeque essa missão de conservação. O fogo, que começou a 40 quilômetros da propriedade, após um caminhão pegar fogo em uma estrada, percorreu grandes distâncias e chegou até a fazenda, mais uma vez desafiando a equipe local. Na Caiman, onde o objetivo é preservar a natureza em vez de explorá-la, o incêndio não foi apenas uma tragédia ambiental; foi também uma lição dura sobre os desafios do futuro.

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A Fazenda Caiman foi atingida por um incêndio originado de um caminhão a quilômetros de distância, expondo desafios na conservação do Pantanal.
Caminhão incendiado que deu origem ao fogo que se alastrou por mais de 40 quilômetros, atingindo parte da Fazenda Caiman, no Pantanal.

Roberto Klabin, fundador da Fazenda Caiman e um apaixonado pelo Pantanal, acompanhou de perto o avanço das chamas. Ele está à frente de um dos principais projetos de conservação do Brasil, em uma área que vem sofrendo com o aumento das queimadas e a seca. “Minha força vem do fato de que eu amo este lugar”, diz Klabin, que desde jovem se dedica à preservação do Pantanal. O que diferencia a Caiman de outras propriedades é seu foco: enquanto as fazendas vizinhas produzem gado, a Caiman produz biodiversidade.

Roberto Klabin, fundador da Fazenda Caiman, fala sobre os desafios e as estratégias de recuperação e conservação após os incêndios que atingiram o Pantanal.Roberto Klabin, fundador da Fazenda Caiman, fala sobre os desafios e as estratégias de recuperação e conservação após os incêndios que atingiram o Pantanal.

O Pantanal e o fogo que não respeita fronteiras - O incêndio que atingiu a Caiman começou longe dali, com um caminhão pegando fogo em uma estrada. Esse tipo de incêndio, causado acidentalmente, é um lembrete de como o Pantanal, com sua vegetação seca durante a estação de estiagem, é vulnerável a pequenos incidentes que rapidamente se transformam em grandes tragédias. As chamas avançaram de maneira incontrolável, movidas pelos ventos e pela vegetação queimada pelo sol. Ao chegar à Caiman, encontraram uma fazenda preparada, mas nem por isso imune.

Klabin não é estranho a esse tipo de situação. Nos últimos anos, os incêndios têm se tornado uma parte constante da realidade no Pantanal. "Nós vimos a recuperação do Pantanal de 2019 para cá. Estava tudo caminhando bem. Ele vai se recuperar", diz, com a confiança de quem conhece o ciclo natural da região. Mas ele também sabe que esses incêndios recorrentes exigem uma mudança de postura e de estratégias. "Esse incêndio nos ensina muito. Ele tem que fazer com que a gente mude a maneira de pensar o Pantanal."

Queimadas controladas: estratégia ou necessidade? Na Caiman, uma das principais estratégias para lidar com os incêndios é o manejo integrado de fogo, uma prática que consiste em realizar queimadas controladas antes da chegada da temporada seca, para reduzir a quantidade de material inflamável e, assim, impedir que o fogo se espalhe livremente. Segundo Klabin, essa prática ajudou a salvar algumas áreas da fazenda. "Queimamos algumas áreas antes do incêndio, e essas áreas não foram atingidas. Agora, estão brotando de novo", explica ele.

Vista aérea da Fazenda Caiman após os incêndios, com vastas áreas de solo queimado, evidenciando o impacto das queimadas no Pantanal.
Vista aérea da Fazenda Caiman após os incêndios, com vastas áreas de solo queimado, evidenciando o impacto das queimadas no Pantanal.

No entanto, as queimadas controladas não são suficientes para evitar completamente os danos causados por um incêndio tão severo como o que aconteceu recentemente. A água, recurso fundamental no combate ao fogo, está cada vez mais escassa no Pantanal, e Klabin sabe que a fazenda precisa de mais soluções. “Vamos abrir mais poços, criar mais açudes e garantir que a fazenda esteja preparada para suportar esses eventos", afirma ele.

Tanques de armazenamento de água na Fazenda Caiman, parte das estratégias de adaptação para enfrentar incêndios futuros, garantindo abastecimento hídrico em áreas críticas do Pantanal.
Tanques de armazenamento de água na Fazenda Caiman, parte das estratégias de adaptação para enfrentar incêndios futuros, garantindo abastecimento hídrico em áreas críticas do Pantanal.

Há também outra questão: a utilização de retardantes químicos, substâncias que podem ajudar a conter o fogo no início, muito utilizadas em outros países. No Brasil, esses produtos ainda não são amplamente adotados, e Klabin acredita que chegou a hora de rever essa prática. "Temos que entender por que não usamos retardantes aqui no Brasil. Isso deveria ser uma prática normal", sugere ele.

Um refúgio de biodiversidade em risco - A Caiman, com sua extensa área destinada à preservação da fauna e da flora pantaneiras, é um refúgio para algumas das espécies mais ameaçadas do país. Projetos como o Arara Azul e o Onça-Pintada, conduzidos na fazenda, são fundamentais para a preservação da biodiversidade local. Agora, a Caiman se prepara para sediar mais uma iniciativa, o Projeto Tamanduá-Bandeira, liderado pela veterinária Flávia Miranda, que busca estabelecer uma clínica permanente para o cuidado de animais afetados por desastres como o incêndio recente.


Área devastada pelos incêndios na Fazenda Caiman, com troncos queimados e solo enegrecido, ilustrando a extensão dos danos causados pelas chamas na vegetação do Pantanal.

Durante as últimas semanas, muitos animais foram encontrados feridos, sem ter para onde fugir das chamas. "Encontramos muitos animais com patas queimadas, sem ter refúgio. Precisamos pensar em alternativas para protegê-los nesses momentos críticos", lamenta Klabin. A ideia de criar abrigos específicos para esses momentos de crise é um dos focos da fazenda daqui para frente.

A pata da onça Miranda estava com queimaduras
Veterinários tratam as patas queimadas de um animal resgatado após os incêndios no Pantanal, evidenciando o impacto das queimadas na fauna local.

Turismo e conscientização: o Pantanal precisa ser visto - Além de seu papel na conservação, a Fazenda Caiman também tem um lado crucial para a sobrevivência do Pantanal: o turismo. Receber visitantes interessados em observar a fauna local e aprender mais sobre a biodiversidade é parte da estratégia da fazenda para garantir sua sustentabilidade financeira e, mais importante, promover a conscientização sobre a importância dessa região.

Para Klabin, a presença de turistas não é apenas uma questão de lucro, mas de visibilidade. “O Pantanal precisa de vocês. Sem os visitantes, o Pantanal não é conhecido e respeitado”, enfatiza ele. A fazenda reabrirá no dia 29 de setembro, após uma pausa forçada pelos incêndios, com a expectativa de atrair ainda mais pessoas dispostas a conhecer e apoiar a causa da conservação.

O desafio de preservar o Pantanal em tempos de incerteza - O Pantanal, com sua fauna exuberante e sua vegetação única, está no centro de um debate global sobre as consequências das mudanças climáticas e da degradação ambiental. A Caiman, com sua longa história de preservação, é um exemplo do que pode ser feito para proteger esse ecossistema. Mas, como o recente incêndio mostrou, o caminho não é simples.

Refúgio Ecológico Caiman fecha temporariamente devido a danos graves causados pelo fogo
Vista aérea da Fazenda Caiman, um santuário de conservação no Pantanal que busca proteger a biodiversidade da região e se recuperar após os incêndios recentes.

Para Klabin, o futuro da fazenda e do Pantanal depende da capacidade de adaptação. Ele acredita que, com medidas preventivas e a colaboração de todos, é possível transformar o Pantanal em um exemplo global de conservação. "A Caiman tem que ser o 'driver', aquele que aponta a direção de medidas que todos, não só a Caiman, podem tomar para resolver o problema", conclui ele, confiante de que, com esforço coletivo, o Pantanal pode sobreviver aos desafios que virão.

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