
O Instituto Delta do Salobra, sediado em Miranda, no Pantanal Sul, confirmou um registro raro: a presença do jacaré-coroa (Paleosuchus trigonatus) na região do Delta do Salobra. O animal, pequeno, de hábitos noturnos e com focinho comprido, já era conhecido pelos pesquisadores da área há mais de dez anos — mas nunca tinha sido anunciado publicamente.

O cineasta e fundador do Instituto, Maurício Copetti, explicou que o jacaré-coroa não é exatamente uma surpresa. “A gente sabia da presença dele, mas nunca havíamos divulgado oficialmente”, afirmou. Guias da Pousada Refúgio da Ilha e pesquisadores do IDS já haviam feito registros informais da espécie, típica da Amazônia, mas pouco comum no Pantanal.
Um bicho discreto, num lugar especial - Diferente do jacaré-do-pantanal, o jacaré-coroa evita áreas abertas e prefere os córregos sombreados dentro da mata. Vive à espreita, longe da vista. Tem o focinho mais estreito, a cauda curta e um porte bem menor — o que ajuda a passar despercebido, mesmo em uma região cheia de olhos treinados.
O Delta do Salobra é um lugar à parte. São 25 mil hectares de matas e águas que funcionam como ecótono, uma zona de transição entre o Pantanal e a Mata Atlântica. É o tipo de lugar onde o bicho da mata encontra o bicho da água. E onde a mistura de biomas cria um corredor natural para espécies que, de outra forma, talvez não coexistissem.
“O Salobra nasce na Serra da Bodoquena, área ainda preservada da Mata Atlântica. Isso torna o Delta um território único, onde convivem espécies de dois mundos”, explicou Copetti.
Diferenças visuais entre o jacaré-coroa (acima) e o jacaré-do-pantanal (abaixo). - Fotos: Instituto Delta do Salobra/IDS
A ameaça vem de fora - A notícia do jacaré-coroa reforça um ponto que o IDS repete com frequência: a importância de proteger o Delta. A região está sob pressão constante. O avanço da fronteira agrícola, o uso de agrotóxicos e o turismo predatório são ameaças reais. O equilíbrio que permite a presença de uma espécie tão rara pode não durar muito.
Na época das cheias, mais de 80% dos campos do Delta ficam alagados, o que transforma o ambiente em um mosaico ideal para aves, mamíferos e répteis. É o tipo de território que serve tanto para abrigo quanto para dispersão de espécies — e por isso tem um valor ecológico desproporcional ao seu tamanho.
Comparativo entre as principais características do jacaré-coroa e do jacaré-do-pantanal, que coexistem no ecótono do Delta do Salobra. - Crédito: Instituto Delta do Salobra/IDS
O silêncio que protege - O jacaré-coroa está ali, mas só se mostra para quem sabe olhar. Ele não busca palco. E talvez por isso tenha escapado por tanto tempo dos registros oficiais. Agora que apareceu, vira símbolo. De um ecossistema que ainda resiste. E de um esforço que precisa continuar.
