
O corregedor nacional de Justiça e ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Mauro Campbell, afirmou que vai intensificar as ações para acabar com o que chama de “juízes TQQ” — magistrados que atuam apenas às terças, quartas e quintas-feiras, em descumprimento à carga horária prevista na legislação. O termo é usado para descrever magistrados que, muitas vezes, sequer residem nas comarcas onde trabalham, especialmente em regiões afastadas, e concentram suas atividades em apenas três dias da semana.

“Não me conformo com isso. É um absurdo”, afirmou o ministro, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo. Segundo ele, o regime informal "TQQ" afronta os princípios da moralidade e da eficiência no serviço público.
Punições brandas e aposentadoria como ‘prêmio’
Campbell também fez críticas duras à Lei Orgânica da Magistratura (Loman), que regula a conduta dos juízes no Brasil. Ele classificou como “prêmio” a aposentadoria compulsória com vencimentos integrais, aplicada a magistrados condenados por desvios graves, como fraudes ou corrupção.
“O que seria uma punição passa a ser um prêmio”, disse o ministro, referindo-se ao fato de que, mesmo afastados da função por má conduta, os juízes continuam a receber parte significativa de seus salários com base no tempo de contribuição e nos maiores vencimentos da carreira.
Segundo levantamento do Estadão, a aposentadoria compulsória custa cerca de R$ 60 milhões por ano aos cofres públicos e não guarda relação com os critérios aplicados pela Previdência Social aos demais trabalhadores, o que aprofunda a percepção de desigualdade e impunidade.
Histórico da prática e resistência
A existência de juízes “TQQ” foi detectada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2008, quando a Corregedoria identificou que diversos magistrados concentravam suas atividades apenas em três dias úteis, por não residirem nas comarcas onde atuavam.
Desde então, diferentes presidentes e corregedores do CNJ prometeram coibir a prática, mas as ações esbarram em resistência institucional e em pressões de entidades representativas da magistratura.
“Houve um julgamento de um TQQ no CNJ. Mas, para se chegar a esse julgamento, o relator quase apanhou. Associações de classe quase deram nele”, relatou Campbell, ao reforçar o desafio que é enfrentar a estrutura corporativista que resiste a mudanças na carreira.
Impacto na imagem do Judiciário
O modelo de punição criticado por Campbell, somado à jornada irregular dos “TQQs”, tem repercutido negativamente na imagem do Judiciário. Em sua crítica, o ministro reforça que o país precisa de juízes comprometidos com a função pública, especialmente em tempos de descrédito das instituições.
“Imagine, juízes ganhando uma fábula se comparar com um trabalhador comum e ainda por cima não querem residir na comarca. Faça-me o favor”, disparou.
Propostas e próximos passos
A intenção de Mauro Campbell é propor revisões na Loman, de modo a tornar as punições mais severas e adequadas à conduta dos magistrados. O corregedor também deve apresentar diretrizes mais rígidas de controle de frequência e atuação presencial dos juízes, com foco especial em comarcas do interior e regiões com menor fiscalização.
A revisão da Loman, porém, depende do Congresso Nacional, que é responsável por alterar a legislação. Campbell defende que essa discussão seja enfrentada de forma séria e transparente, com o objetivo de reconquistar a confiança da sociedade.
