
A rotina dos profissionais da enfermagem em Mato Grosso do Sul tem se tornado cada vez mais difícil, especialmente em locais onde o atendimento é urgente, como as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Nessas unidades, a violência contra os trabalhadores da saúde tem crescido, e junto com ela, também aumenta o adoecimento mental desses profissionais.

O tema foi debatido nesta quarta-feira (25), durante o seminário “Desafios na Gestão em Saúde: Enfrentamento à Violência contra Profissionais de Enfermagem”, na Assembleia Legislativa. O evento reuniu profissionais da saúde, especialistas, representantes do governo e de entidades que atuam na defesa dos trabalhadores.
Profissionais da saúde cada vez mais doentes - A procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS), Cândice Gabriela Arosio, chamou atenção para o aumento dos problemas de saúde mental entre trabalhadores, especialmente os da área da saúde. Segundo ela, nos últimos 10 anos, o número de afastamentos por transtornos mentais quase dobrou no Brasil, passando de 221 mil em 2014 para 472 mil em 2024.
Ela disse que o ambiente de trabalho, que deveria ser um lugar de dignidade, muitas vezes tem feito as pessoas adoecerem. “O trabalho tem deixado muita gente doente. Isso acontece em todo o mundo, mas no Brasil a situação é ainda mais grave”, afirmou Arosio.
De acordo com a procuradora, esse problema acontece tanto em empresas privadas quanto no serviço público. Só em 2023, o MPT recebeu mais de 14 mil denúncias de assédio moral e mais de 1.500 denúncias de assédio sexual no país. “Essas situações afetam não só a saúde das vítimas, mas também a produtividade e o ambiente nas instituições”, explicou.
UPAs e CAPS: os locais mais afetados - A deputada estadual Gleice Jane (PT), que propôs o seminário, destacou que os casos de agressões físicas e verbais contra profissionais da enfermagem são mais comuns em lugares como as UPAs e os CAPS. Para ela, o problema precisa ser tratado com urgência.
“De um lado está o paciente, que quer ser atendido logo. Do outro, o profissional da saúde, que muitas vezes está sobrecarregado e sem estrutura. Isso gera conflitos, que acabam em agressões”, disse a parlamentar. Ela defendeu mudanças para melhorar as condições de trabalho e proteger quem está na linha de frente.
Mulheres e profissionais negros são os mais atingidos - A pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Maria Helena Vieira Machado, também participou do evento e apresentou um estudo nacional sobre a situação dos profissionais da enfermagem. Segundo ela, 80% dos mais de 3 milhões de trabalhadores da área são mulheres, em grande parte negras, pardas e indígenas.
“Essas pessoas enfrentam jornadas longas, ganham pouco e muitas vezes precisam trabalhar em mais de um lugar para conseguir pagar as contas. Não dá para discutir as condições de trabalho sem falar de racismo, machismo e desigualdade”, explicou Maria Helena.
Ela defendeu que o governo crie políticas específicas para combater esses problemas, garantindo proteção e melhores salários para os profissionais.
Ações para acolher as vítimas e mudar o cenário - Durante o seminário, o presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-MS), Leandro Afonso Rabelo Dias, e o conselheiro Wilson Brum falaram sobre os casos de violência que têm sido registrados em Mato Grosso do Sul e como o Conselho tem ajudado os profissionais que foram vítimas.
Outras autoridades também participaram, como a promotora de Justiça Daniela Cristina Guiotti, que falou sobre os obstáculos que as vítimas enfrentam para denunciar as agressões; a secretária municipal de Saúde de Campo Grande, Rosana Leite de Mello; e o superintendente do Hospital Universitário da UFGD, Hermeto Macario Amin Paschoalick.
O que fazer em caso de violência - A procuradora Cândice Arosio lembrou que o MPT-MS não atua apenas para punir os agressores, mas também para ajudar a construir soluções que melhorem o ambiente de trabalho. Ela orientou que, sempre que houver um caso de violência ou assédio, o profissional deve procurar ajuda.
“É importante denunciar. O trabalhador pode procurar o MPT, os sindicatos, ouvidorias ou comitês internos da própria instituição. Também deve guardar provas e contar com apoio de colegas e da família”, explicou.
Ela também destacou que quem comete agressões pode ser punido com demissão por justa causa ou responder a processos administrativos e até penais, dependendo do caso.
O seminário mostrou que enfrentar a violência no ambiente de trabalho é urgente e necessário. Para isso, é preciso que os órgãos públicos, os empregadores e a sociedade olhem com mais atenção para quem cuida da saúde dos outros — e que também precisa ser cuidado.
