Grupo Feitosa de Comunicação
(67) 99974-5440
(67) 3317-7890
21 de novembro de 2025 - 15h15
refis
GERAL

Projetos liberam spray de pimenta e taser para mulheres em meio à alta da violência

Rio e Amazonas avançam com leis de autoproteção feminina; especialistas alertam para riscos e brechas legais

21 novembro 2025 - 14h30Carla Nigro
Propostas estaduais querem liberar spray de pimenta e tasers para defesa pessoal de mulheres
Propostas estaduais querem liberar spray de pimenta e tasers para defesa pessoal de mulheres - (Foto: Freepik)

Às vésperas do Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, celebrado em 25 de novembro, Estados como Rio de Janeiro e Amazonas avançam com propostas que autorizam o uso de spray de pimenta e armas de eletrochoque por mulheres como forma de autoproteção. As medidas, defendidas como resposta ao aumento dos casos de feminicídio no país, reacendem o debate sobre segurança, legislação e responsabilidade do Estado.

Canal WhatsApp

No Rio, o Projeto de Lei nº 6.141/2025, que permite a compra de spray de extratos vegetais por mulheres, foi aprovado pela Assembleia Legislativa e aguarda sanção do governador Cláudio Castro. Já no Amazonas, a Lei nº 7.753/2025, que autoriza o porte de armas de eletrochoque com até 10 joules, entra em vigor no dia 14 de dezembro.

Casos reais impulsionam propostas - A produtora de eventos Eliane Zacarias, 49 anos, moradora do Rio de Janeiro, afirma que o spray de pimenta salvou sua vida. Após 25 anos em um casamento marcado por abusos, foi durante uma agressão em 2023 que ela reagiu com o dispositivo. “Ele me encurralou e começou a me bater. Consegui pegar o spray e dei um jato no rosto dele. Foi a primeira vez que consegui paralisá-lo e pedir socorro”, relatou. Mesmo com medida protetiva, Eliane conta que o ex-marido insiste em descumpri-la.

Histórias como a dela ilustram a urgência do tema. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça, mais de 818 mil novos casos de violência doméstica ingressaram na Justiça apenas até setembro deste ano.

O projeto fluminense autoriza a venda de até dois frascos de spray de pimenta por mês a mulheres maiores de 18 anos, limitada a estabelecimentos farmacêuticos. A concentração máxima do produto seria de 20%. O texto também prevê a distribuição gratuita para mulheres com medida protetiva.

No Amazonas, a legislação exige laudo psicológico, certidão negativa de antecedentes criminais e curso de orientação para a aquisição da arma de eletrochoque. O uso de modelos com dardos energizados continua proibido.

Para a advogada Gabriela Mansur, referência no enfrentamento à violência de gênero, esses instrumentos não substituem políticas públicas estruturais, mas podem salvar vidas. “Em um país que falha sistematicamente na proteção das mulheres, qualquer instrumento adicional pode significar a diferença entre a vida e a morte”, afirma.

Já Izabelle Ramalho, vice-presidente da Comissão Nacional de Gênero do IBDFAM, critica a transferência de responsabilidade para as vítimas. “É um desvio do foco. O Estado falha em proteger e entrega o ônus da defesa às mulheres. Isso não ataca a raiz do problema”, pontua.

Ela também chama atenção para riscos operacionais: “Sem o preparo técnico de agentes de segurança, a mulher pode ser desarmada e ver o dispositivo virar arma contra ela.”

Apesar da comoção social, as iniciativas estaduais enfrentam entraves legais. O spray de pimenta é classificado como Produto Controlado pelo Exército (PCE), o que exige autorização para compra e uso. Já os tasers são regulamentados apenas para forças de segurança.

Segundo o advogado criminalista Matheus Sardinha, o uso de sprays por civis pode gerar sanções administrativas e até penais. “A pena prevista varia de seis meses a quatro anos, dependendo do enquadramento”, explica. Ele acrescenta que a regulação de armamentos é competência da União, o que torna as leis estaduais vulneráveis a ações de inconstitucionalidade.

Casos semelhantes já foram vetados em Estados como Amapá e Distrito Federal. Em 2024, o governador Ibaneis Rocha (MDB) barrou um projeto alegando que Estados não podem legislar sobre produtos controlados.

Venda fácil na internet e Congresso em debate - Na prática, sprays e tasers são amplamente comercializados na internet, com entrega facilitada e pouca exigência legal. Enquanto isso, projetos tramitam no Congresso Nacional para autorizar o porte controlado dos dispositivos por mulheres — especialmente aquelas com medida protetiva. Parte das propostas prevê critérios como laudos, registro e cursos de manuseio.

O debate divide opiniões, mas converge num ponto: o Brasil segue entre os países que mais matam mulheres. Para Gabriela Mansur, não basta reagir. “Precisamos de prevenção, acolhimento e responsabilização. Um país que não protege suas mulheres, não protege seu futuro.”

Assine a Newsletter
Banner Whatsapp Desktop