
Todo começo de ano costuma vir acompanhado de promessas de mudança. O problema é que, para muita gente, os planos feitos em janeiro não sobrevivem aos meses seguintes. Em grandes cidades, onde o tempo parece sempre curto por causa do trabalho, do trânsito e do cansaço, organizar a vida pessoal acaba virando mais um desafio na rotina.
Os dados confirmam que essa dificuldade não é isolada. Um estudo da Universidade Edith Cowan, na Austrália, mostrou que a maioria das pessoas abandona as resoluções de ano novo ainda no primeiro mês. Já uma pesquisa norte-americana publicada na PubMed, que acompanhou 200 pessoas por dois anos, apontou que 77% mantiveram as metas por apenas uma semana e só 19% conseguiram segui-las ao longo de todo o período.
Para especialistas, o problema não está na falta de força de vontade, mas na forma como as mudanças são planejadas. “O planejamento, normalmente, não é prioridade, e isso coloca as pessoas em um ciclo constante de frustração”, avalia a gestora de projetos Ana Laura Lobo.
Começar pelo papel
O primeiro passo é simples, mas costuma ser ignorado: listar tudo o que se deseja fazer no ano seguinte. A orientação é escrever sem filtros, incluindo desde pequenas vontades até projetos maiores. Nesse momento, não é necessário detalhar nem julgar. A lista tende a ficar extensa e deve ser revisitada depois.
Na segunda etapa, entra a definição de prioridades. Com o tempo limitado pela rotina, é preciso reconhecer que nem tudo cabe no mesmo período. Ana Laura sugere dividir os objetivos em três grupos: urgentes, agendáveis e importantes, mas adiáveis.
Trazer as metas para a realidade
Segundo a cientista comportamental Giu Tessitore, o início do ano cria uma falsa sensação de ruptura. “Existe a ideia de que há um ‘eu do futuro’ que dará conta do que nunca conseguimos fazer”, explica. O caminho mais eficiente é olhar para trás, entender o que já funciona, o que vale manter e o que precisa ser interrompido.
Apesar do clima de recomeço, a rotina continuará exigente. Por isso, as metas precisam dialogar com a realidade. Querer aprender francês, por exemplo, exige responder perguntas práticas: haverá tempo para estudar, dinheiro para aulas ou disciplina para manter o hábito diariamente?
Metas viram projetos
Com objetivos mais realistas definidos, o próximo passo é transformá-los em projetos, divididos em etapas menores. Metas muito amplas costumam desmotivar. “Quando o objetivo parece distante demais, a chance de desistência aumenta. Passos menores dão mais segurança”, explica Giu.
Em vez de “juntar dinheiro”, definir um valor específico e um prazo claro torna o objetivo mensurável. As pequenas conquistas ao longo do caminho ajudam a manter o engajamento. “Não é só empolgação no começo, é sustentar o processo”, reforça a especialista.
Estratégia faz diferença
Se uma tentativa falhou no passado, insistir do mesmo jeito pode não funcionar. Quem não conseguiu manter a academia pode se beneficiar de desafios coletivos ou aplicativos. Quem quer ler mais pode buscar um clube do livro.
“O ser humano não é naturalmente disciplinado sozinho. Ter alguém acompanhando facilita”, afirma Ana Laura. Outra alternativa é criar consequências, como apostas simbólicas ou compromissos que gerem desconforto se a meta não for cumprida. Recursos visuais, como vision boards, também ajudam a manter os objetivos em evidência.
Revisar é parte do processo
Um erro comum é planejar e nunca mais revisar. As especialistas recomendam reservar um dia fixo por mês para avaliar avanços, ajustes e próximos passos. Organizar a semana também ajuda a lidar com a sensação constante de falta de tempo.
“Tentar transformar a rotina em aliada é fundamental”, diz Ana. O processo precisa gerar algum tipo de recompensa no caminho. “Não dá para esperar satisfação só no final. O durante também importa”, completa Giu.
Ajustar não é fracassar
O cérebro tende a resistir a mudanças. Há um pico inicial de motivação, seguido de recuo diante das dificuldades. Saber disso ajuda a insistir um pouco mais. Se os obstáculos persistirem, vale ajustar o plano.
“O planejamento é um rascunho. Ele pode e deve ser repensado”, lembra Giu. Não cumprir um prazo não significa fracasso, apenas necessidade de adaptação.
Menos é mais
Outro ponto-chave é aceitar limites. Tentar fazer tudo ao mesmo tempo aumenta a frustração. “A rotina perfeita é a que funciona na prática”, resume a especialista. Em muitos casos, focar em uma meta por vez é a escolha mais sustentável.
Entre os erros mais comuns estão a comparação excessiva com outras pessoas, o excesso de metas para um único ano e a falta de atenção aos próprios limitadores, como tentar usar menos o celular mantendo o aparelho sempre por perto.

