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Balneário Piçarras vai ampliar faixa de areia pela quarta vez e reacende debate ambiental

Obra de R$ 38 milhões promete conter erosão e atrair turistas, mas especialistas alertam para impactos ecológicos

7 agosto 2025 - 16h45Willian Canan
Praia no Balneário Piçarras, em Santa Catarina, vai passar pelo quarto alargamento da faixa de areia.
Praia no Balneário Piçarras, em Santa Catarina, vai passar pelo quarto alargamento da faixa de areia. - (Foto: Andrey Jorge)

Balneário Piçarras, no litoral de Santa Catarina, vai ampliar a faixa de areia da Praia Central pela quarta vez em menos de 30 anos. A nova obra prevê a engorda de dois dos sete quilômetros de orla do município, com investimento de R$ 38,289 milhões. A engorda das praias tem sido uma das estratégias adotadas para driblar a erosão costeira, um dos principais efeitos das mudanças climáticas.

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Além de Piçarras, Balneário Camboriú e Florianópolis são outras cidades catarinenses que também já fizeram intervenções desse tipo.

A cidade de Balneário Piçarras, no litoral norte de Santa Catarina, vai ampliar novamente a faixa de areia da sua Praia Central, numa tentativa de combater os efeitos da erosão costeira e atrair mais turistas para a temporada de verão. Com investimento previsto de R$ 38,289 milhões, essa será a quarta intervenção em menos de 30 anos na orla do município, que já passou por obras semelhantes em 1998, 2008 e 2012.

A nova obra, cujo edital está aberto até o dia 5 de setembro, pretende engordar dois dos sete quilômetros da orla da cidade. O prazo para conclusão da intervenção será de 70 dias após a assinatura do contrato com a empresa vencedora, mas ainda não há data definida para o início dos trabalhos. “Temos problemas na nossa orla com ressaca marítima e já sofremos com isso há alguns anos”, explicou o prefeito Tiago Baltt (MDB), ao comentar a motivação para a obra.

O processo envolve o uso de dragas, embarcações especializadas que retiram sedimentos do fundo do mar e os depositam na orla, em um aterro artificial que aumenta a largura da faixa de areia. A estratégia tem sido usada também em outras cidades catarinenses, como Balneário Camboriú e Florianópolis, e é cada vez mais comum em regiões turísticas com alta pressão urbanística e vulnerabilidade costeira.

Segundo a prefeitura, além de conter os danos causados pela erosão provocada pelas mudanças climáticas, a obra tem como objetivo valorizar a orla, aumentar a segurança pública em áreas de lazer e impulsionar o turismo durante o verão. A expectativa é que o novo espaço possa atrair mais visitantes e gerar empregos temporários, sobretudo em setores como comércio e hotelaria. “O alargamento da faixa de areia também é uma ferramenta de desenvolvimento econômico”, defendeu o prefeito Tiago Baltt.

A proposta, no entanto, enfrenta desafios desde 2017, quando a prefeitura começou a discutir publicamente a nova engorda. Já foram lançados três editais desde então. O primeiro fracassou por falta de interessados. O segundo foi suspenso após suspeita de sobrepreço, o orçamento era de R$ 24 milhões, mas os lances superaram os R$ 32 milhões, e o Tribunal de Contas do Estado embargou o processo.

Para viabilizar a nova licitação, o município recorreu ao Instituto Nacional de Pesquisas Hidroviárias (INPH), que elaborou um estudo técnico para embasar o edital atual. “Entendemos que o que estava sendo feito não poderia existir do jeito que estava, então fizemos novos estudos para lançar essa nova licitação”, explicou Baltt.

Apesar dos benefícios econômicos e da tentativa de adaptação ao avanço do mar, a engorda das praias gera preocupação entre pesquisadores e ambientalistas. Segundo o professor de Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Paulo Horta, a prática altera ecossistemas marinhos e pode ter efeitos colaterais tanto para o meio ambiente quanto para os frequentadores das praias. “As mudanças climáticas provocam as chamadas ‘praias famintas’, porque o sedimento não chega no mar e, quando chega, tem um processo erosivo que produz praias com cada vez menos areia”, explica o professor.

Além disso, Horta alerta que essas obras liberam gases como o metano e o gás carbônico, agravando o aquecimento global. E os efeitos da obra podem durar cada vez menos tempo diante do avanço do nível do mar. “Apesar do alargamento da faixa de areia nos dar mais tempo para evitar tragédias humanas, o processo pode acelerar outros problemas ambientais”, diz o pesquisador.

Em maio deste ano, pesquisadores da UFSC divulgaram uma nota técnica em que avaliam as consequências de intervenções como a de Piçarras. O documento destaca que, em praias artificialmente alteradas, há relatos de:

  • Aumento de lesões em banhistas, como problemas na coluna, devido a ondas que quebram com maior força em praias mais íngremes;

  • Aumento nos casos de afogamento, causados por correntes de retorno mais intensas;

  • Prejuízos à biodiversidade, com redução de habitats naturais e distúrbios nos ciclos reprodutivos de espécies marinhas.

Ciente dos riscos ambientais, a prefeitura afirma ter elaborado um plano de contenção de danos e preservação, que deverá ser seguido obrigatoriamente pela empresa vencedora da licitação. Entre as medidas, destacam-se:

  • Uso de dragas com defletores para evitar a captura acidental de tartarugas marinhas e outros animais;

  • Criação de zonas de preservação nas áreas de retirada de sedimentos, permitindo a procriação da fauna marinha;

  • Monitoramento ambiental durante e após a obra para avaliar o impacto real da intervenção.

A cidade afirma que o plano será acompanhado por órgãos ambientais e instituições científicas, em busca de maior transparência e segurança no processo.

Intervenções como a de Piçarras se multiplicam pelo mundo como medidas de curto e médio prazo para mitigar os efeitos da elevação do nível do mar, um dos principais sintomas das mudanças climáticas globais. Embora não sejam soluções definitivas, essas obras servem como estratégias emergenciais para garantir tempo de adaptação e evitar perdas humanas e econômicas.

A expectativa da prefeitura é que, com o novo alargamento, a cidade fique protegida pelos próximos cinco a dez anos, dependendo da intensidade das mudanças climáticas e do uso da orla.

Balneário Piçarras segue os passos de outras cidades catarinenses que também recorreram à engorda da praia como estratégia de enfrentamento à erosão. Balneário Camboriú, por exemplo, realizou uma das maiores obras desse tipo no Brasil em 2021, ampliando sua faixa de areia de 25 para 70 metros em alguns trechos.

Florianópolis, por sua vez, tem realizado alargamentos em trechos específicos como forma de proteger áreas urbanas e turísticas com risco de serem engolidas pelo mar.

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