
A megaoperação policial realizada no dia 28 de outubro nos complexos do Alemão e da Penha, no Rio de Janeiro, contou com menos da metade dos agentes equipados com câmeras corporais. Segundo depoimentos prestados ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), apenas 134 dos 343 policiais envolvidos na ação estavam com os dispositivos acionados. A operação resultou em 121 mortos, número que a torna a mais letal da história do estado.
Os dados foram apresentados pelo comandante do Batalhão de Operações Especiais (Bope), Marcelo Corbage, e pelo chefe da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) da Polícia Civil, Fabricio Oliveira. O MP investiga possíveis abusos cometidos durante a ação, que tinha como alvo lideranças do Comando Vermelho.
De acordo com Corbage, dos 215 policiais do Bope que participaram da ação, apenas 77 portavam câmeras corporais. O comandante afirmou que os equipamentos foram distribuídos de forma que “todas as frações contassem com ao menos um policial com câmera”. Ele também admitiu ao MP que não foi cogitada a necessidade de baterias extras. “Acreditava-se que a operação teria um tempo normal de duração de cerca de cinco a seis horas”, declarou.
Já na Core, unidade de elite da Polícia Civil, 57 dos 128 agentes atuaram com câmeras corporais, conforme depoimento de Oliveira. Assim, em números totais, apenas 39% dos policiais das duas forças estavam devidamente monitorados por câmeras durante toda a operação.
As informações fornecidas pelos comandos das duas unidades reforçam as preocupações levantadas pelo Ministério Público sobre a condução da operação. Um relatório técnico produzido pela Divisão de Evidências Digitais e Tecnologia (DEDIT), a partir de exames de necropsia, apontou “lesões atípicas” em dois dos 121 corpos. Um deles apresentava ferimentos causados por disparo de arma de fogo à curta distância; o outro, sinais de decapitação.
Esses achados, considerados graves pelos promotores, levaram à recomendação de uma investigação aprofundada. Os investigadores do MP pedem uma “análise minuciosa das imagens das câmeras corporais dos agentes envolvidos na operação”, além da reconstituição do local por escaneamento digital do ambiente.
A ofensiva das forças de segurança foi direcionada contra integrantes do Comando Vermelho, organização criminosa que atua no tráfico de drogas nos complexos da Penha e do Alemão. A ação mobilizou centenas de policiais e helicópteros blindados, resultando em confrontos prolongados nas comunidades.
A operação rapidamente se tornou alvo de críticas de entidades de direitos humanos e agora está sob análise do Ministério Público, que apura possíveis excessos e irregularidades. A letalidade da ação, somada à baixa adesão no uso de câmeras corporais — dispositivo considerado essencial para garantir a transparência das operações —, levantou questionamentos sobre a condução e os protocolos seguidos pelas forças envolvidas.
O MPRJ continua reunindo depoimentos e analisando as imagens disponíveis das câmeras corporais para tentar esclarecer os episódios suspeitos identificados na necropsia de alguns corpos. A falta de cobertura em vídeo da maioria dos policiais envolvidos pode dificultar a identificação de eventuais abusos ou violações de protocolo.
A expectativa é que o órgão finalize um relatório com recomendações e possíveis encaminhamentos legais a partir das análises técnicas e audiências com os responsáveis pelas unidades envolvidas na ação.

