
Denis Mukwege, ginecologista congolês e Prêmio Nobel da Paz de 2018, utilizou sua plataforma na Rio Innovation Week para lançar uma nova campanha internacional chamada Linha Vermelha, com o objetivo de erradicar o estupro como arma de guerra. Em sua palestra, realizada na quinta-feira, Mukwege destacou a necessidade urgente de impedir que o corpo de mulheres e meninas seja transformado em campo de batalha em conflitos armados.

Mukwege é amplamente reconhecido por seu trabalho no Hospital Panzi, em Bukavu, na República Democrática do Congo (RDC), onde desde 1999 atende vítimas de violência sexual, principalmente mulheres afetadas pela guerra civil que assola o país há mais de 30 anos. Até hoje, o hospital já prestou assistência a mais de 80 mil mulheres, com pelo menos dez novas pacientes chegando diariamente.
Em sua fala, o médico relatou a experiência da primeira paciente atendida, que havia sido estuprada coletivamente, na frente da família, de maneira brutal, com seus órgãos genitais sendo torturados. "Achamos que era um caso isolado, mas logo percebemos que não era. O corpo das mulheres estava sendo transformado em campo de batalha", disse Mukwege, que agora levanta sua voz contra essa tática de guerra, considerada barata e devastadora.
Mukwege ressaltou que o uso do estupro como arma de guerra não é exclusivo da RDC, mas ocorre também em conflitos atuais como os da Colômbia, Sudão, Síria e Ucrânia. Além das graves consequências individuais para as vítimas, o estupro em conflitos traz efeitos coletivos e intergeracionais, incluindo o deslocamento de famílias, a destruição do sistema reprodutivo das mulheres, a propagação de doenças sexualmente transmissíveis e a erosão do tecido social das comunidades.
Mukwege também destacou o impacto econômico dessa violência, já que as mulheres são fundamentais para as economias rurais e frequentemente se veem forçadas a abandonar suas aldeias e suas atividades. "Essas mulheres não apenas perdem sua dignidade, mas também seu papel vital nas comunidades", afirmou. No Hospital Panzi, além do tratamento físico, as mulheres recebem apoio psicológico, assistência social e orientação jurídica, com o objetivo de ajudá-las a se reintegrar economicamente à sociedade e a buscar justiça.
Para Mukwege, a razão pela qual o estupro continua sendo utilizado como estratégia de guerra é, em grande parte, sua aceitação no contexto do patriarcado. Em sua opinião, os Estados também devem ser responsabilizados, além de haver uma responsabilização individual dos criminosos. Ele defende que os estupros em conflitos devem ser tratados como crimes de guerra e inaceitáveis como tática militar.
A educadora e ativista moçambicana Graça Machel, também presente no evento, destacou a necessidade de inovação inclusiva. "A inovação só faz sentido quando coloca as pessoas no centro. Se pensarmos em inovações para substituir as pessoas, estaremos no caminho errado. Precisamos trazer as pessoas da periferia para o centro, não aumentar o número à margem", afirmou. Machel também enfatizou a importância de ciência e tecnologia para unir as pessoas e não para afastá-las.
