
O comandante do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais), tenente-coronel Marcelo Corbage, contestou publicamente a versão do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), sobre a estratégia do chamado “Muro do Bope”, utilizada durante uma operação policial na Serra da Misericórdia, que resultou em dezenas de mortes. A fala de Corbage foi dada em depoimento ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ).
“Não é verdade que os policiais do Bope tenham se posicionado previamente na Serra da Misericórdia para fazer o que é conhecido como ‘troia’”, afirmou Corbage, em referência a uma emboscada ilegal onde agentes se escondem para surpreender suspeitos. A declaração rebate diretamente o principal argumento do governador, que defendeu a ação como planejada e pensada para evitar confrontos em áreas habitadas.
Castro afirmou, em entrevista, que os confrontos ocorreram, majoritariamente, em área de mata e que essa teria sido uma decisão estratégica para minimizar os riscos à população. “Foi pensado para encurralá-los lá para que a população sentisse o mínimo possível”, declarou.
O secretário da Polícia Militar, Marcelo de Menezes, reforçou a versão oficial, explicando que a operação contou com “incursão de tropas do Bope na área mais alta da montanha da Serra da Misericórdia, que divide os complexos da Penha e do Alemão”, e que a estratégia ficou conhecida internamente como “Muro do Bope”.
Apesar das versões apresentadas, ainda não está claro se houve ou não posicionamento prévio dos policiais no alto da mata ou se os agentes foram atraídos para a área após movimentações dos criminosos. Corbage sustentou que os traficantes se anteciparam, buscando emboscar os policiais civis.
“Imagens de drone mostram criminosos se deslocando ordenadamente para a Vacaria, claramente com a intenção de preparar uma emboscada para as forças de segurança. Em razão da relativa falta de resistência, os policiais civis foram progredindo, sendo atraídos para uma armadilha”, explicou o comandante do Bope.
A estratégia conhecida como “Muro do Bope” consiste em uma linha de contenção com tropas posicionadas estrategicamente para forçar a movimentação de suspeitos em determinada direção — no caso, para o topo do morro. Segundo a Secretaria de Segurança, a operação teve 60 dias de planejamento e visava retomar o controle de uma região dominada por facções criminosas.
No entanto, a revelação de Corbage levanta dúvidas sobre a transparência da operação e o grau de articulação entre as forças policiais e o governo estadual, principalmente após o número elevado de mortos ser registrado em área de mata.

A operação da Serra da Misericórdia segue sob investigação do Ministério Público, que apura possíveis excessos e omissões das forças de segurança. A divergência entre as declarações de autoridades civis e militares reacende o debate sobre a condução de ações em áreas de conflito e o uso de estratégias que possam colocar em risco tanto os policiais quanto a população.

