
Mato Grosso do Sul, estado com a terceira maior população indígena do Brasil, terá em breve uma unidade do Cais Indígena (Centro de Acesso a Direitos e Inclusão Social). O local vai oferecer tratamento contra o abuso de álcool e drogas, problema recorrente nas aldeias da região. A implantação está prevista para este ano, segundo o Governo Federal.

O município que vai sediar o centro ainda não foi definido. De acordo com o Ministério da Justiça, a decisão será tomada em maio, após ouvir lideranças do povo Guarani-Kaiowá, um dos mais afetados pela falta de políticas públicas específicas.
Com aldeias superlotadas e muitas vezes próximas à fronteira com o Paraguai, o uso abusivo de substâncias tem impacto direto no aumento de violência doméstica, desnutrição, suicídios e abandono escolar. Um levantamento da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) feito nas aldeias Bororó e Jaguapiru, em Dourados, apontou que beber, que antes era algo pontual em rituais, passou a ser parte da rotina de sofrimento: “violências, suicídios, desnutrição infantil, abuso do uso de álcool e outras drogas são algumas das sequelas”.
Durante o Acampamento Terra Livre, em Brasília, em 2024, lideranças indígenas de Mato Grosso do Sul denunciaram a falta de apoio psicológico e clínico. Um dos temas mais citados foi a necessidade de fiscalização de pontos de venda de bebida alcoólica próximos às aldeias, que continuam operando sem controle. O cacique Dirceu Marcos Justino e o líder Wilson Jacobino, da Aldeia Passarinho, em Miranda (MS), foram alguns dos que relataram essa realidade.
O Cais Indígena é parte da Estratégia Nacional Povos Indígenas na Política sobre Drogas, coordenada pelo Ministério da Justiça. A proposta é oferecer acolhimento, escuta qualificada e encaminhamentos adequados, respeitando os modos de vida, línguas e valores das comunidades.
A equipe do centro será multidisciplinar. Participarão profissionais da saúde (SUS), assistência social (Suas), segurança pública (Susp) e de órgãos indigenistas. O atendimento será pensado caso a caso: em alguns, com ações de prevenção; em outros, com foco na redução de danos. A estrutura também oferecerá atividades voltadas à orientação comunitária e fortalecimento da rede de apoio local.
O primeiro Cais Indígena do país foi inaugurado em Tabatinga, no Amazonas, na tríplice fronteira com a Colômbia e o Peru. A cidade foi escolhida devido ao agravamento da vulnerabilidade dos povos locais e à atuação do crime organizado, que usa a área como rota do narcotráfico.
No caso de Mato Grosso do Sul, a proximidade com a fronteira, somada à ausência do Estado em áreas indígenas, ajuda a entender por que o problema se agravou. E por que, depois de Tabatinga, o estado foi o próximo da lista.
