Ao concluir uma visita de três dias à Faixa de Gaza, o cardeal Pierbattista Pizzaballa, Patriarca Latino de Jerusalém, afirmou que a população local vive entre dois sentimentos opostos: a devastação causada por anos de guerra e o desejo persistente de recomeçar. Principal autoridade da Igreja Católica em Israel, Palestina, Jordânia e Chipre, o líder religioso contou ter encontrado uma sociedade extenuada, marcada pela pobreza extrema, mas ainda movida por sinais concretos de esperança.
Em entrevista a veículos de mídia do Vaticano, nesta terça-feira, 23, Pizzaballa descreveu um cenário de destruição profunda. Segundo ele, casas, escolas e hospitais precisam ser reconstruídos praticamente do zero. Em muitos bairros, grande parte da população ainda convive diariamente com esgoto a céu aberto e o acúmulo de lixo, sem acesso adequado a serviços básicos.
Apesar do quadro severo, o cardeal destacou o que considera o ponto mais marcante da viagem: a disposição dos moradores em retomar a normalidade. Em encontros com homens, mulheres e crianças, ele disse ter percebido uma forte vontade de reconstruir o futuro, mesmo em meio a tantas perdas. Essa resistência, na avaliação do patriarca, aparece em pequenos gestos do dia a dia e na recusa em perder a perspectiva de uma vida melhor.
Durante a passagem por Gaza, iniciada em 19 de dezembro, Pizzaballa também presenciou momentos de alegria, especialmente entre as crianças. Um dos episódios que mais o marcaram foi a encenação de um presépio vivo, organizada pela comunidade local. O cardeal relatou que a serenidade nos olhares dos pequenos durante a celebração emocionou quem estava presente e mostrou um Natal vivido de forma simples, mas sincera.
De acordo com o patriarca, o Natal em Gaza não é feito de grandes festas ou ornamentações. Fora da liturgia, quase não há espaço para comemorações mais amplas. Ainda assim, ele afirmou que a celebração é marcada por um sentimento genuíno de alegria, que nasce da fé e do encontro entre as pessoas, mesmo em um contexto de falta de recursos e de limitações severas.
Em suas declarações, Pizzaballa chamou atenção para a percepção que os moradores têm do olhar do mundo sobre Gaza. Segundo o cardeal, a população não se sente totalmente abandonada. Ele ressaltou ser importante separar a atuação da comunidade política, que decide sobre conflitos e fronteiras, da presença da sociedade civil, que tem demonstrado solidariedade e apoio de diversas maneiras.
Ao falar sobre paz, o líder católico reforçou que o conceito é exigente em uma região marcada pela guerra e pela violência. Para ele, não basta desejar a paz ou defendê-la nos discursos. É necessário criar condições reais, sólidas e estáveis para que ela possa se firmar. Isso passa pela reconstrução de estruturas básicas, pela garantia de dignidade à população e por iniciativas que ultrapassem o campo das declarações formais.
Em mensagem dirigida aos cristãos, o patriarca insistiu que não se deve fugir da realidade atual, por mais dura que seja. Ele lembrou que, de acordo com a fé cristã, Jesus entrou na história em um contexto imperfeito, em meio a conflitos e fragilidades, assim como o vivido hoje em Gaza. Na visão de Pizzaballa, cabe às pessoas assumir esse momento histórico e trabalhar para transformá-lo, em vez de apenas lamentar as dificuldades.
Após retornar a Jerusalém, o cardeal concedeu coletiva de imprensa e voltou a alertar para a gravidade da situação econômica na Faixa de Gaza. Segundo ele, a fase mais crítica de escassez de alimentos foi parcialmente superada, mas a maior parte da população não tem condições financeiras de comprar o que precisa para se alimentar com dignidade. O problema, agora, não é apenas de oferta de mantimentos, e sim de renda.
Pizzaballa relatou ainda que se impressionou com o número elevado de crianças vivendo nas ruas. Disse haver preocupação com o futuro dessa geração, que cresce em meio à destruição, à falta de oportunidades e à instabilidade permanente. A presença dessas crianças fora da escola e sem estrutura familiar adequada é vista pelo cardeal como um dos sinais mais dramáticos da crise em Gaza.
Para o Patriarca Latino de Jerusalém, a visita reforçou a ideia de que a esperança dos moradores da Faixa de Gaza não é uma simples frase de efeito, mas uma escolha diária. Mesmo convivendo com pobreza extrema, falta de infraestrutura básica e incerteza sobre o amanhã, parte da população continua a apostar na possibilidade de reconstrução. A missão da Igreja, segundo ele, é permanecer ao lado dessas pessoas, dando voz à realidade local e apoiando o esforço de recomeço.
As informações sobre a viagem e os relatos do cardeal foram divulgadas por veículos do Vaticano, entre eles a Agência Vatican News, que acompanhou as declarações do patriarca sobre a situação em Gaza, o cotidiano das comunidades cristãs e a mensagem de Natal dirigida aos fiéis da região.
