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CAPITAL

Campo Grande apaga passado das fossas e escreve novo capítulo com esgoto tratado

Cidade vira referência em saneamento com impactos na saúde, no meio ambiente e na vida dos moradores

18 outubro 2025 - 10h40Carlos Guilherme
Em 25 anos de atuação, Águas Guariroba ampliou o acesso à água tratada para 99% da população de Campo Grande, mais de 953 mil pessoas.
Em 25 anos de atuação, Águas Guariroba ampliou o acesso à água tratada para 99% da população de Campo Grande, mais de 953 mil pessoas. - (Foto: Divulgação)

Sentada na cadeira de fio, à sombra de um grande pé de manga, a auxiliar de cozinha Francisca Brito, 59, serve um gole de tereré enquanto separa o feijão que vai ao fogo. O quintal de chão ainda guarda as marcas do tempo e da rotina, mas hoje tem outro ar.

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Moradora da mesma casa no bairro Santa Luzia desde o ano de 1989, ela lembra bem dos dias em que a fossa fazia parte da paisagem e do odor da casa: “O cheiro invadia a casa, principalmente à noite. No verão, o quintal sempre recebia as ‘visitas’ de mosquitos, ratos, baratas, escorpiões... Tudo vinha junto”, recorda. Hoje, com a rede de esgoto finalmente instalada, ela fala com alívio e um sorriso no rosto: “A limpeza ficou mais fácil, não sinto mais aquele odor, e as crianças quase não ficam doentes como antes”, explica.

Dona Francisca: 'Minha vida e de toda a família mudou bastante por conta dos investimentos no saneamento básico' - (Foto: Carlos Guilherme)

Situações como a de Francisca se repetem em diversos bairros de Campo Grande. Cada nova ligação à rede de esgoto representa um avanço na saúde pública e na qualidade de vida. É nesse cenário, feito de mudanças no dia a dia das pessoas, que a Águas Guariroba comemora seus 25 anos de atuação, uma trajetória marcada não só por obras de infraestrutura, mas pela transformação real na vida dos moradores.

Francisca conhece bem os problemas causados pela falta de saneamento. “O esgoto corria pela rua, chegava no muro, descia pela calçada. Era direto”, conta. Quando a rede foi instalada, ela sentiu a mudança no dia a dia: “O bairro melhorou, minha casa valorizou e a saúde da minha neta também melhorou”, diz. Relatos como esse mostram, na prática, como a chegada do esgoto encanado transforma a vida das pessoas.

“A limpeza ficou mais fácil, não sinto mais aquele odor, e as crianças quase não ficam doentes como antes”, explica dona Francisca

O desafio do saneamento no Brasil hoje - Para entender o panorama de Campo Grande, é preciso ver o Brasil do saneamento. Embora haja avanços, ainda restam lacunas. No Censo 2022, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que cerca de 75,7% dos domicílios têm sistema adequado de esgotamento (rede coletora ou fossa adequada). Ou seja, um em cada quatro residências ainda está sem saneamento ideal.

A Lei 14.026/2020, conhecida como Novo Marco Legal do Saneamento, traçou metas ambiciosas: até 2033, 99% da população terá acesso à água potável e 90% ao esgotamento sanitário tratado. No entanto, estudos recentes indicam que muitos estados só chegariam a esse patamar por volta de 2066. Mato Grosso do Sul hoje se consolidou entre os estados que mais avançam na ampliação do saneamento básico no Brasil. Com 72,34% da população atendida pela rede de esgoto, o Estado ultrapassa a média nacional.

Em meio a esse cenário, Campo Grande se destaca. A cobertura urbana de esgoto na cidade saltou de ~18% em 2000 para 94% atualmente, bem acima da média nacional e adiantando prazos legais.

Dona Francisca hoje faz comida sem se preocupar por conta da água tratada - (Foto: Carlos Guilherme)

Em 2000, quando assumiu a concessão, a Águas Guariroba encontrou uma cidade com saneamento quase inexistente. Poucas residências tinham rede de esgoto, muitas usavam fossas ou escoamento improvisado.

Em 25 anos de atuação, a empresa ampliou o acesso à água tratada para 99% da população de Campo Grande, mais de 953 mil pessoas. Já a cobertura de esgoto alcança 94%, com todo o volume coletado passando por tratamento. Apenas nos últimos três anos, foram implantados 580 km de rede, beneficiando cerca de 150 mil moradores. Segundo a concessionária, as metas foram atingidas com antecedência em relação ao cronograma previsto.

As estações de tratamento (ETEs) são peças-chave nesse processo. A ETE Los Angeles, inaugurada em 2008, e a ETE Imbirussu, em 2012, somam o tratamento de mais de 92 milhões de litros por dia. Em breve, a ETE Botas, no Jardim Colúmbia, vai elevar ainda mais essa capacidade, com previsão de tratamento de 600 milhões de litros por ano. O laboratório da concessionária foi o primeiro no Estado a obter acreditação do INMETRO em sete parâmetros de qualidade.

Saúde pública – Os efeitos práticos do saneamento aparecem nas estatísticas de saúde. Em 2015, foram notificados 41.939 casos de diarreia; em 2024, esse número caiu para 35.400. Em 2020 e 2021, anos de expansão intensa, houve 26.815 e 38.243 casos, respectivamente.

Levantamento obtido neste mês pelo jornal A Crítica com a Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), mostra que doenças como hepatite A, leptospirose e toxoplasmose seguem com menos de 40 casos por ano, um sinal de estabilidade em uma região antes sujeita a surtos. Doenças como esquistossomose e rotavírus praticamente não registraram ocorrências recentes.

Campo Grande é uma das únicas capitais do País que apresenta mais de 90% de esgoto tratado - (Foto: Divulgação)

Para o presidente da Águas Guariroba, Gabriel Buim, o investimento traz impacto direto. “Cada real investido gera economia de quatro na saúde pública. Não vemos, mas é visível nos hospitais, com menos internações. Percebemos o quanto saneamento básico se resume em qualidade de vida da população campo-grandense”, avalia.

Cidade subterrânea - Para o arquiteto e conselheiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso do Sul (CAU/MS), Gustavo Shiota, o saneamento básico é o ‘esqueleto invisível’ de uma cidade bem planejada. “Imagine a cidade como um corpo; o saneamento é o sistema circulatório: não se vê, mas faz tudo funcionar. As redes bem estruturadas permitem que espaços públicos, como calçadas largas, parques lineares, ciclovias convivam em harmonia com a vida urbana”, detalha.

Shiota defende que o desenvolvimento urbano deve obedecer à capacidade de rede existente. “Um bom planejamento urbano começa com uma pergunta simples: a rede dá conta? Antes de aprovar novos loteamentos, é essencial saber se a área tem capacidade de esgotamento sanitário e abastecimento. Quando esse diagnóstico é feito antes, o projeto já nasce com o traçado das redes, coletores, estações elevatórias e faixas técnicas planejadas”, explica.

Em Porto Alegre (RS), o Grupo Hospitalar Conceição, com apoio do CAU/RS, vai incluir arquitetos e urbanistas nas equipes de saúde da família a partir de 2026. A proposta é levar o olhar sobre o espaço, moradia e infraestrutura para dentro da unidade básica de saúde.

Esses profissionais poderão identificar riscos no ambiente construído, como umidade, falta de ventilação, esgoto irregular ou risco de enchente, e propor soluções acessíveis. Com apoio de programas públicos, é possível trocar um piso mal drenado, melhorar a ventilação de um cômodo ou corrigir ligações sanitárias precárias.

“Mesmo sem aparecer, o saneamento básico tem impacto direto no ambiente urbano. Ruas sem mau cheiro, sem valas ou vazamentos, convidam as pessoas a circular e permanecer nos espaços públicos. Isso fortalece o comércio de bairro, valoriza os imóveis e reforça o senso de pertencimento da comunidade”, defende.

Da poluição à recuperação – Com o avanço da rede de esgoto em Campo Grande nos últimos 20 anos, o município registrou mudanças significativas na forma como lida com o esgoto doméstico. Um dos impactos mais visíveis foi a queda no uso de fossas rudimentares, que antes infiltravam resíduos no solo ou despejavam diretamente em córregos e rios, sem nenhum tipo de tratamento.

Hoje, o esgoto é coletado e tratado antes de ser descartado, o que melhora a qualidade da água, protege o lençol freático e reduz a contaminação dos cursos d’água urbanos. Os principais beneficiados são os rios Anhanduí e Segredo.

Segundo a engenheira ambiental Dayana Reverdito, a qualidade da água dos rios melhorou, com menos contaminação e maior transparência. “Isso tem permitido a recuperação da fauna e da flora aquáticas, além da redução de odores e da proliferação de vetores de doenças. O saneamento contribui para um uso mais equilibrado dos recursos naturais, preservando o ambiente sem comprometer sua função para as futuras gerações”, salienta.

Apesar dos números positivos, o cenário ambiental da Capital ainda pode avançar. Segundo o relatório mais recente do Programa Córrego Limpo, parceria entre a Águas Guariroba e a Prefeitura, 81% dos córregos da Capital apresentam boa qualidade da água, o melhor índice desde 2010. O levantamento, mostra que houve um aumento de 22% na classificação “boa” e uma redução de 16% na classificação “ruim” em relação ao ciclo anterior. No entanto, o resultado ainda está aquém do ideal: 19% dos córregos seguem em condição regular ou insatisfatória.

“Para que o sistema de saneamento siga eficiente nas próximas décadas, é fundamental reforçar a educação ambiental. A população precisa entender como o sistema funciona, seus benefícios e como colaborar. Além disso, o investimento contínuo em infraestrutura e monitoramento é essencial para garantir o equilíbrio entre o crescimento urbano e a preservação ambiental”, pontua a engenheira.

Um dos pilares do abastecimento de Campo Grande é o córrego Guariroba, de onde são captados mais de 115 milhões de litros de água por dia, o que representa 41% do abastecimento da Capital. Para garantir a sustentabilidade desse volume, a empresa mantém, em parceria com produtores rurais da região, ações contínuas de recuperação da Área de Proteção Ambiental (APA) do Guariroba. O trabalho inclui o plantio de mudas nativas e práticas de conservação do solo, contribuindo diretamente para a manutenção da vazão e da qualidade da água que chega às torneiras da população.

Justiça social e os próximos passos - A universalização em Campo Grande também chegou à Tarifa Social. O programa da Águas Guariroba concede desconto de 50% nas tarifas de água e esgoto para 23 mil famílias (cerca de 64,4 mil pessoas). A meta é atender 53 mil famílias até 2026.

Profissionais trabalham todos os dias para garantir qualidade em Campo Grande - (Foto: Divulgação)

Além disso, até 2028, o plano é alcançar 98% de cobertura na cidade, com 697km adicionais de rede e 66 mil novas ligações. O investimento previsto de R$ 750 milhões irá contemplar a modernização da rede de água e perfurações de poços.

Conforme o presidente da concessionária, o contrato prevê esse percentual porque há regiões onde o investimento seria desproporcional para poucas casas. A Lei do Marco Legal do Saneamento considera 90% como cobertura universalizada.

“Estamos adiantados em relação a isso. O avanço é fruto de um planejamento iniciado em 2000 e que, só foi possível graças à articulação entre a concessionária, o poder público e a própria população. Sabemos que obras de saneamento causam transtornos, mas quando a gente está próximo da população, ouvindo e sendo transparente, consegue responder rápido e manter a qualidade do serviço que Campo Grande merece”, afirma.

Hoje, dona Francisca, aquela mesma moradora que conhecemos no começo da nossa história, caminha por um quintal que não cheira mais. “Parece que vivo em outro lugar quando me lembro de quando me mudei pra cá. Ganhamos saúde e dignidade”, conta ela. A ‘Capital Morena’ ainda enfrenta desafios, é verdade, mas o que foi construído até aqui já deixa um legado sólido. Em 2003, apenas um em cada cinco campo-grandenses tinha acesso ao esgoto tratado. Hoje, são quase 19 em cada 20. E falta pouco para ser 20 de 20.

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