
O presidente da Argentina, Javier Milei, anunciou nesta segunda-feira (16) um aumento nos investimentos sociais a partir de 2026, após sofrer um revés nas eleições legislativas da Província de Buenos Aires. O anúncio veio acompanhado de um discurso mais moderado do que o habitual, em que afirmou que "o pior já passou", sinalizando uma mudança de estratégia a poucos dias da votação nacional que vai redefinir a composição do Congresso.

Apresentando o orçamento para 2026, Milei garantiu que os gastos com aposentadorias, saúde e educação — setores fortemente impactados pela política de ajuste fiscal — terão crescimento acima da inflação. Segundo o governo, os recursos destinados à saúde terão aumento de 17%, a educação receberá 8% a mais e os benefícios previdenciários subirão 5%. Auxílios para pessoas com deficiência também terão acréscimo de 5%.
Desde que assumiu, Milei tem adotado uma política de forte austeridade, que ele define como “o maior ajuste da história da humanidade”. Essa medida permitiu à Argentina alcançar equilíbrio fiscal pela primeira vez em 14 anos e controlar a inflação, mas gerou impacto social severo, com cortes em áreas essenciais.
Embora tenha reafirmado que o equilíbrio fiscal é “inegociável”, o novo discurso é visto como tentativa de conter os danos políticos da derrota recente e reverter a perda de popularidade. Para o economista Juan Manuel Telechea, o presidente reconheceu os limites do ajuste. “É uma mudança de postura para tentar reconquistar votos em outubro”, analisou.
Milei ainda opera com o orçamento de 2023, já defasado devido à inflação acumulada. Tentativas anteriores de aprovar novas peças orçamentárias fracassaram por falta de apoio parlamentar. A proposta apresentada prevê crescimento do PIB em 5%, inflação de 10,1% e superávit de 1,4% do PIB. O câmbio médio estimado é de 1.423 pesos por dólar, abaixo da cotação atual.
Especialistas alertam, no entanto, que a elevação dos gastos pode colocar em risco a meta fiscal. “O governo terá que compensar esse aumento cortando despesas em outras áreas”, pondera Juan Luis Bour, diretor da Fundação Fiel.
O cenário político argentino está conturbado. Após a derrota eleitoral em Buenos Aires, o governo Milei enfrenta desconfiança do mercado. A Bolsa de Buenos Aires e ações argentinas em Wall Street caíram, o dólar disparou e o risco país aumentou.
Além disso, Milei sofre pressões internas após o Congresso derrubar, pela primeira vez, um veto presidencial — relacionado a recursos para a agência de apoio a pessoas com deficiência. O órgão está no centro de um escândalo de corrupção que envolve sua irmã e secretária-geral da Presidência, Karina Milei.
O governador da Província de Buenos Aires, Axel Kicillof, ironizou a frase “o pior já passou”, usada por Milei. “Essa é uma daquelas frases repetidas da direita argentina. Ele prometeu que o ajuste seria para a ‘casta’, mas atingiu os mais vulneráveis”, criticou.
Pesquisa recente da Universidade Torcuato di Tella indica queda de 13,6% no índice de confiança no governo em agosto, mesmo antes do escândalo vir à tona.
Com as eleições legislativas marcadas para 26 de outubro, Milei tenta conter a perda de apoio e mostrar disposição para ajustes no discurso e na prática, ainda que mantendo a rigidez fiscal como pilar do seu governo.
