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Venda de íris segue proibida no Brasil: ANPD rejeita nova proposta da Worldcoin

Mesmo com alterações no modelo de negócio, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados manteve a proibição da troca de dados biométricos por criptomoedas no projeto liderado por empresa de Sam Altman

6 agosto 2025 - 17h00Mariana Cury
Orb, a câmera que registra imagem de alta resolução da íris dos usuários
Orb, a câmera que registra imagem de alta resolução da íris dos usuários - (Foto: Leo Souza/Estadão)

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) rejeitou, no último dia 18 de julho, uma nova tentativa da empresa Tools for Humanity — liderada por Sam Altman, também CEO da OpenAI — de retomar a coleta de dados biométricos de brasileiros em troca de recompensas em criptomoedas. A decisão foi divulgada nesta terça-feira, 5 de agosto.

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Com isso, a prática apelidada de “venda de íris” segue proibida no país.

Entenda o caso

Em janeiro de 2025, a ANPD já havia impedido a empresa de oferecer tokens digitais (Worldcoin/WLD), que podiam ser trocados por dinheiro, a usuários que aceitassem escanear a íris e fornecer outros dados biométricos. A prática chegou a render entre R$ 300 e R$ 700 por pessoa, dependendo da cotação do token, e atraiu principalmente pessoas em situação de vulnerabilidade social — como ocorreu em São Paulo, primeira cidade a receber o projeto.

Segundo a Autoridade, o incentivo financeiro comprometia o livre consentimento dos usuários e criava um desequilíbrio na relação entre empresa e cidadão. Por isso, determinou a suspensão da operação da empresa no Brasil.

Nova proposta: recompensa indireta por indicação

Para tentar voltar ao mercado brasileiro, a empresa apresentou um novo modelo: não haveria pagamento direto ao usuário que fornecesse seus dados. Em vez disso, ele poderia indicar outras pessoas para o cadastro, e, se essas pessoas também escaneassem a íris, o “indicador” receberia recompensas em tokens.

Na prática, o incentivo financeiro seria deslocado para um segundo momento e vinculado à ação de terceiros.

Mas a ANPD entendeu que, mesmo assim, a lógica permanecia a mesma: os dados biométricos continuavam sendo trocados por dinheiro, ainda que de forma indireta. A Autoridade considerou que o novo modelo continuava explorando a coleta de informações sensíveis em troca de benefícios financeiros.

“Ainda que se observe, na nova proposta, um aparente distanciamento entre a coleta de dados pessoais e a concessão da contraprestação, tal separação não é suficiente para afastar os riscos já identificados”, apontou o diretor da ANPD, Arthur Pereira Sabbat.

A decisão reforça que, nesse modelo, o dado biométrico não é apenas uma etapa de verificação, mas o próprio "produto" oferecido em troca de valor econômico, mesmo que mediado por um programa de indicação.

Reações

A Worldcoin (marca do projeto da Tools for Humanity) disse, em nota, que discorda da interpretação da ANPD e pretende recorrer na Justiça. Segundo a empresa, programas de indicação são comuns em setores como financeiro e telecomunicações, e a proposta cumpre as exigências da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).

Apesar disso, organizações como o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) apoiaram a decisão da ANPD. O Idec considera que o novo modelo segue explorando o contexto de vulnerabilidade de parte dos usuários, mantendo o mesmo problema identificado na suspensão inicial.

“A proposta ainda compromete a autonomia dos titulares, especialmente em contextos de vulnerabilidade socioeconômica”, disse a entidade.

Como funcionava o sistema da Worldcoin?

O projeto World ID exigia escaneamento da íris e reconhecimento facial para gerar uma identidade digital única, que poderia comprovar que o usuário é um ser humano, e não uma inteligência artificial. Em troca, o usuário recebia tokens de criptomoeda que podiam ser convertidos em reais por meio de aplicativo próprio da empresa.

O objetivo declarado era criar um sistema de “prova de humanidade” em meio à crescente presença de sistemas de IA. Mas a iniciativa levantou sérias preocupações sobre consentimento livre, privacidade e riscos à proteção de dados pessoais.

A empresa segue impedida de operar o modelo de negócio no Brasil.

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