
Nesse último sábado, dia 20 de janeiro, morreu em seu restaurante (onde era também sua casa) na França o Chef Paul Bocuse. Foi considerado pela revista Gault & Millau o mais importante e respeitado cozinheiro nascido no século XX. Dentre muitos feitos, e estrelas, foi o criador da Nouvelle Cuisine, revolucionário movimento que tratou a cozinha francesa com novos olhos. Deixando de lado a maneira de servir convencional dos restaurantes, levando para o comensal experiências de menu degustação, porções requintadas, belas aos olhos e de sabores que viriam a privilegiar o produto. Soa tão contemporâneo, não? Pois esse movimento aconteceu há mais de 30 anos e repercutiu por todo o mundo.
Um dos lugares que serviu de fonte de inspiração para Bocuse foi o Japão, com sua cozinha minimalista, local onde o papa das panelas era também reverenciado. Ele deixou discípulos por onde passou. Esteve também no Brasil nos anos 80 para assinar o cardápio do saudoso hotel Le Meridién em Copacabana. Desse seu legado, jovens cozinheiros franceses por estas terras desembarcaram e afinaram sua cozinha européia à bossa e ao samba carioca. Claude Troisgrois e Laurent Suadeau foram dois deles. Será que podemos imaginar a cozinha brasileira de hoje sem esses ícones, que tão logo chegaram, apaixonaram-se pelas frutas tropicais e escolheram pátria verde-amarela para viver? Que marrravilha!
O instituto com assinatura Paul Bocuse foi criado nos anos 90, e forma milhares de alunos desde então. Não só em técnicas culinárias de preceitos franceses mas também nas artes da hotelaria e hospitalidade. Agitados confeiteiros, padeiros e maitres trabalham diariamente numa afinação de ballet pelos: corredores, salões e cozinhas da escola dePaul Bocuse que fica dentro de um castelo nos arredores de Lyon, França. A prestigiosa união do chef com universidades de gastronomia pelo mundo criou o curso Alliance, o qual fiz parte da turma de 2006. Além disso, filiais do Instituto estão também no continente asiático e americano.
Paul Bocuse e Paulo Machado, no Institut Paul Bocuse, em Lyon, na França
Sem dúvida alguma, minha história internacional na gastronomia, a qual tenho plena convicção de que a construção é diária e nunca acaba, não teria início mais feliz se não começasse no instituto do aclamado chef. Foi lá que descobri sabores, técnicas e tive contato com tomate que tinha gosto de tomate, berinjela que chegava fresquinha e orgânica, cogumelos frescos que eram por nós limpos a pincel, pães de fermentação natural, terrines e quenelles, além de produtos com denominação de origem controlada, o crucial selo DOP, o qual franceses dão tanto valor.
Turma Aliance, do Instituto Paul Bocuse, em 2006Na França, cozinheiros têm o mesmo patamar de respeito que engenheiros, médicos e advogados. Sem desmerecer outras áreas, mas a diferença com que nosso Brasil trata um profissional de hospitalidade é gritante. Em terras tupiniquins, a gente ainda vive um conflito de falta de orgulho e identidade profissional quando o assunto é cozinha. Garçom ainda é visto por muitos como uma das últimas opções de emprego. Profissionais mal remunerados, pouco valorizados e muitas vezes maltratados por comensais arrogantes que não sabem, por vezes, nem se portar a mesa. A falta de respeito, repito, não é geral, mas o desnível comparando com a profissão nos países europeus é gritante. Ainda temos caminho de mudança pela frente.
O Chef Paul Bocuse e sua trajetória vieram para ajudar a mostrar ao mundo que um profissional de gastronomia pode e deve servir sempre com orgulho, sorriso no rosto e muita, mas muita mesmo convicção, de que, como ele mesmo dizia, só existe uma cozinha: a boa!
Descanse em paz, grande mestre.

