
Na tarde de terça-feira (25 de novembro), o plenário do Senado votou com um silêncio estrondoso. Por 57 votos a favor e nenhuma objeção, foi aprovado o PLP 185 de 2024, que regulamenta as aposentadorias de agentes comunitários de saúde e agentes de combate a endemias. Apenas duas abstenções foram registradas. A proposta segue agora para a Câmara dos Deputados.
A votação praticamente unânime não significa ausência de tensão. Ao contrário. O projeto foi aprovado como um recado claro, ainda que não declarado, ao Palácio do Planalto. Nos bastidores, a movimentação é vista como um gesto político direto contra a indicação de Jorge Messias ao Supremo Tribunal Federal, feita pelo presidente Lula. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, preferia outro nome: o do senador Rodrigo Pacheco.
Enquanto o texto ganhava força no plenário, o governo via sua base se dissolver. Até mesmo partidos aliados, como o PT, orientaram voto favorável, mesmo sob alerta da área econômica. O Novo foi o único partido contrário. A Confederação Nacional de Municípios estima impacto superior a R$ 100 bilhões para os cofres públicos. O déficit previdenciário já ultrapassa R$ 1 trilhão.
As novas regras permitem aposentadoria integral com paridade e reajustes iguais aos da ativa. A idade mínima para homens será de 52 anos com 20 de exercício, e para mulheres, 50 anos com o mesmo tempo. Há ainda uma fórmula alternativa que considera tempo de contribuição em outras atividades. Dirigentes sindicais também serão incluídos.
O texto é de autoria do senador Veneziano Vital do Rêgo, que justificou a proposta com base nos riscos da atividade. Segundo ele, os agentes atuam sob constante exposição a doenças infecciosas e sofrem com condições que comprometem a saúde mais cedo do que o comum.
O projeto havia sido aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais em outubro, mas ficou à espera do momento político certo. Ele chegou ao plenário poucos dias depois da confirmação de Jorge Messias como indicado ao STF. A leitura política é de que Alcolumbre usou a pauta como forma de pressionar o governo, num jogo de forças silencioso, porém evidente.
A votação foi acompanhada por dezenas de agentes de saúde, que encheram a galeria. Eles observaram em silêncio o placar se formar. Lá embaixo, no centro do plenário, o senador Wellington Fagundes, da oposição, foi o relator do texto. “Cada R$ 1 investido nesses profissionais economiza-se de R$ 4 a R$ 7 em internações”, disse, citando dados da área de saúde.
Davi Alcolumbre não deixou sem resposta as críticas de que o projeto seria uma pauta bomba. Lembrou iniciativas como o Pé-de-Meia e o Vale-Gás, de autoria do Executivo, também com impacto fiscal relevante, e que não receberam o mesmo rótulo. “Isso foi uma resposta da Casa da Federação do Brasil a milhares de pessoas pobres e que se dedicam todos os dias a salvar a vida de outros pobres”, disse o senador.
Veneziano reforçou: “A aposentadoria especial já existe na Constituição. O que fizemos foi regulamentar”. O projeto ainda pode sofrer veto presidencial, mas já há sinalizações de que, caso isso ocorra, o Congresso pode derrubá-lo. O clima é de conflito latente, onde aposentadorias se tornam símbolo de algo maior: o desconforto entre Senado e Planalto.



