
A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou nesta terça-feira, 29, que o pacote de medidas em elaboração pelo governo federal para responder à tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos às exportações brasileiras deve ser encarado como uma “reação”, e não como uma “retaliação”. Segundo ela, o movimento liderado pelo presidente norte-americano Donald Trump carrega forte motivação política, influenciada por aliados da família Bolsonaro.

“Não é o Brasil que saiu da mesa de negociação. O governo Lula sequer conseguiu se sentar. Trump não quer conversar com o Brasil, e isso tem uma motivação ideológica muito clara”, disse a ministra em entrevista à GloboNews.
A sobretaxa anunciada por Trump deve entrar em vigor na próxima sexta-feira, 1º de agosto, e atinge uma série de produtos brasileiros, em especial os ligados à indústria de base e ao agronegócio. Dentro do governo Lula, o tom tem sido de cautela para evitar uma guerra comercial com os EUA, como revelou o Estadão/Broadcast.
Influência bolsonarista e ataque ao STF
Para Tebet, o anúncio da tarifa tem como pano de fundo não apenas interesses econômicos, mas também um objetivo político de desgaste ao Judiciário brasileiro, sobretudo ao Supremo Tribunal Federal (STF). “Acredito que a medida foi direcionada ao ministro Alexandre de Moraes, mais do que ao presidente Lula. Trump uniu a fome com a vontade de comer: aproveitou o fator econômico para atingir um aliado do bolsonarismo.”
Ela afirmou que Trump está sendo “induzido ao erro” por mentiras difundidas por Eduardo Bolsonaro, que desde março vive nos Estados Unidos e tem feito articulações junto a setores da extrema-direita americana. “As mentiras da família Bolsonaro chegaram ao Trump e influenciaram essa postura. É uma questão ideológica e estratégica.”
Lula disposto a dialogar, mas ambiente é hostil
Segundo Tebet, o presidente Lula está disposto a conversar diretamente com Donald Trump, mas há preocupação sobre a ausência de um ambiente propício para o diálogo. “O presidente não tem problema em pegar o telefone e ligar. Mas é preciso que haja um ponto de partida mínimo, para que o ‘pós-telefonema’ não seja ainda pior do que a situação atual.”
Para a ministra, o governo americano ainda não explicitou exatamente o que deseja do Brasil, o que torna difícil qualquer avanço. “O que os EUA querem? O que ainda não têm do Brasil? Há algo que o Brasil já poderia ter oferecido e não ofereceu? Esse ponto de partida precisa ser construído.”
Apostas em minerais críticos e transferência de tecnologia
Um dos caminhos possíveis de aproximação entre os dois países está na área de minerais estratégicos. Tebet mencionou a possibilidade de acordos em torno de terras raras e minerais críticos — recursos de grande interesse para a indústria americana.
“Nós temos o que os EUA querem: terras raras, minerais estratégicos e oportunidades de investimento. Mas não vamos abrir mão das nossas regras ambientais e da nossa soberania. Minerar na Amazônia, por exemplo, está fora de questão”, afirmou.
O governo estuda lançar ainda neste ano uma política nacional para atração de investimentos em minerais críticos, tema que deverá ganhar destaque na COP-30, que será realizada em Belém (PA), em 2025.
Pacote tem foco em apoio e defesa comercial
Sobre o pacote de medidas preparado para enfrentar os impactos da tarifa americana, Tebet explicou que ele tem “menos viés fiscal do que se imagina” e inclui linhas de crédito, estímulos à exportação e possíveis ações antidumping. “Nosso objetivo não é retaliar, mas proteger os setores mais atingidos, como o aço e a agroindústria.”
A ministra avaliou que o governo tem capacidade de sustentar medidas de apoio por até dois anos, caso a tarifa seja mantida. “Estamos falando de um esforço pontual, mas que não compromete o equilíbrio fiscal. A ideia é garantir que os setores mais expostos consigam se adaptar e buscar novos mercados.”
Tebet também deixou claro que o governo aguarda até o último momento por algum recuo dos EUA. “Vamos esperar até o dia 1º de agosto. Pode haver redução nas alíquotas para determinados setores ou até uma postergação da entrada em vigor. Ainda não está tudo definido.”
Democracia e soberania não estão em jogo
Durante a entrevista, a ministra fez questão de reforçar que, embora esteja aberto ao diálogo, o governo brasileiro não aceitará colocar em risco valores fundamentais. “Democracia e soberania são inegociáveis. Essas bandeiras não vão para a mesa de negociação.”
Ela destacou que, apesar das dificuldades impostas pela postura do governo Trump, o Brasil tem acumulado protagonismo em pautas globais, como sustentabilidade, inclusão e equilíbrio comercial. “O mundo olha para o Brasil com respeito. Estamos construindo relações sólidas com União Europeia, China, países da América Latina. Não somos uma economia isolada.”
Big techs e regulação digital
Tebet também comentou brevemente a atuação do governo e do STF em relação às plataformas digitais e à disseminação de desinformação. “A regulação da apologia ao crime nas redes sociais é inegociável. O STF foi equilibrado, e o governo segue firme nessa pauta. Isso não tem a ver com censura, mas com responsabilidade.”
Tebet: 'Brasil tem o que os EUA querem, mas portas estão fechadas'
Para a ministra, a postura da Casa Branca reflete uma decisão deliberada de isolar o Brasil por motivações políticas. “As portas estão fechadas. O Brasil tem muito a oferecer, mas não será tratado como subalterno. Nossa resposta será técnica, estratégica e sem abrir mão dos nossos valores.”
Ela encerrou dizendo que o presidente Lula “sai fortalecido ao defender a soberania nacional”. “Não estamos de joelhos. Estamos com responsabilidade e estratégia, trabalhando por um Brasil respeitado e com protagonismo internacional.”
