
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira, 10, a PEC 148/2015, que propõe acabar com o modelo de jornada 6x1 — um formato ainda predominante em diversos setores do mercado de trabalho brasileiro, especialmente no comércio e nos serviços. A aprovação foi simbólica e ocorreu em meio a um clima de tensão sobre o avanço da pauta às vésperas do recesso legislativo. Agora, o texto segue para análise do plenário da Casa.
De autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), a proposta estabelece um limite de 8 horas diárias e 36 horas semanais, distribuídas em até cinco dias por semana, sem redução salarial. O modelo representa uma mudança significativa em relação ao regime vigente atualmente, que permite jornadas extensas e poucos dias de descanso.
A aprovação também é vista como um movimento político do Senado para pressionar a Câmara dos Deputados, que discute projeto semelhante. A disputa interna entre as duas Casas sobre quem liderará a reformulação da legislação trabalhista tem sido pano de fundo para a aceleração da tramitação.
Debate acirrado e divergências dentro da CCJ - A votação simbólica não impediu reações. O senador Eduardo Girão (Novo-CE) criticou publicamente a forma como o projeto foi conduzido na comissão e afirmou que vai tentar alterar o texto quando ele chegar ao plenário. Para Girão, o tema não deveria ter sido votado como item extrapauta e às pressas.
“Me sinto violentado por essa atitude. Sei que teve audiência pública, mas precisava ter o direito de pedir vista”, declarou o parlamentar, evidenciando insatisfação com o que classificou como atropelo no debate legislativo. O pedido de vista permitiria adiar a votação e dar mais tempo para análise e discussão do texto.
A reação recebeu resposta imediata do presidente da CCJ, senador Otto Alencar (PSD-BA), que defendeu a regularidade da tramitação e rebateu as críticas. “Isso é justiça trabalhista para o Brasil. A própria Câmara tem um projeto sobre isso. Chegando, vai ser aprovado e promulgado”, afirmou. Segundo ele, a PEC foi discutida por mais de quatro meses e cumpriu as etapas regimentais necessárias.
A proposta do senador Paulo Paim não estabelece apenas limites rígidos de jornada; ela cria também um processo de transição gradual para adaptação de empresas e trabalhadores. No ano seguinte à promulgação, a carga horária semanal máxima será reduzida para 40 horas. Depois disso, a redução será de uma hora por ano, até chegar às 36 horas semanais previstas como regra permanente.
Durante esse período de transição, a PEC mantém a possibilidade de negociação entre empregados e empregadores para compensação de horários e redução da jornada, desde que por acordo ou convenção coletiva. O objetivo, segundo defensores do texto, é evitar choques bruscos no mercado de trabalho e dar tempo para que setores mais dependentes do modelo 6x1 reorganizem escalas, contratações e processos internos.
A mudança tende a afetar diretamente categorias que já trabalham no limite da carga horária permitida, como trabalhadores do comércio, serviços essenciais, redes de supermercados, restaurantes, hotéis e profissionais de áreas com jornadas prolongadas e poucos dias de descanso.
Nos bastidores do Senado, a PEC tem sido apresentada como uma medida de saúde pública e modernização das relações de trabalho. Parlamentares que defendem a proposta afirmam que a redução da jornada pode ampliar a produtividade, diminuir doenças ocupacionais e promover um balanço mais saudável entre vida profissional e pessoal.
O próprio autor da PEC, Paulo Paim, já argumentou em outras ocasiões que jornadas extensas tendem a agravar problemas como estresse, distúrbios do sono, lesões por esforço repetitivo e esgotamento físico, especialmente em áreas que demandam esforço contínuo e atendimento ao público. Ele sustenta que a mudança pode beneficiar tanto trabalhadores quanto empresas, criando ambientes mais equilibrados.
Mesmo entre empresários há setores que enxergam vantagens, sobretudo na reorganização de escalas e na padronização de jornadas, o que poderia reduzir conflitos trabalhistas e elevar índices de satisfação das equipes.
As críticas se concentram principalmente em três pontos:
impacto financeiro para empresas, que poderiam ser obrigadas a contratar mais funcionários para cobrir as novas escalas;
rigidez excessiva, com receio de que a legislação elimine a flexibilidade necessária a determinados segmentos;
velocidade da tramitação, considerada por opositores como insuficiente para um tema tão amplo e sensível.
O senador Eduardo Girão, ao protestar sobre a votação, revelou preocupação com a falta de tempo para aprofundar a discussão. O posicionamento dele ecoa a visão de parte dos parlamentares que argumentam que mudanças dessa magnitude exigem articulação mais ampla com sindicatos, setor produtivo e especialistas em direito trabalhista.
PEC e a disputa entre Senado e Câmara - Outro aspecto que tem marcado o debate é a disputa política pela “paternidade” da reforma trabalhista relacionada à jornada de trabalho. A Câmara dos Deputados também elabora um projeto sobre o tema, e integrantes das duas Casas têm buscado protagonismo na condução da mudança. A aprovação da PEC pela CCJ é vista como um recado claro de que o Senado não está disposto a esperar indefinidamente o avanço do texto na Câmara.
Esse movimento não é novo: historicamente, projetos de impacto social ou econômico costumam gerar tensão institucional quando ganham tração simultânea nas duas Casas legislativas.
Com a aprovação na CCJ, a PEC segue para votação no plenário do Senado. Por se tratar de uma Proposta de Emenda à Constituição, ela precisa de maioria qualificada — ou seja, três quintos dos senadores, em dois turnos de votação.
Caso seja aprovada, a proposta segue para a Câmara dos Deputados, onde todo o processo legislativo recomeça, também em dois turnos e com quórum qualificado. Após isso, se houver aprovação nas duas Casas, o texto pode ser promulgado pelo Congresso.
Parlamentares ligados à base governista afirmam que o tema deve avançar com rapidez, uma vez que há clima de alinhamento entre Executivo e setores do Legislativo. No entanto, opositores prometem atuar para alterar pontos considerados sensíveis e ampliar o debate público.
Embora o release original não traga análises externas, a discussão apresentada pelos senadores evidencia questões frequentemente levantadas por especialistas em direito trabalhista em debates sobre redução de jornada:
— reorganização da cadeia produtiva;
— necessidade de revisão de escalas para atividades essenciais;
— efeitos sobre saúde mental e física;
— potencial aumento de custo operacional para empresas;
— impacto em setores que operam 24 horas.
A transição proposta pode suavizar parte dessas dificuldades, mas não elimina a complexidade do tema, algo que foi central no embate entre Eduardo Girão e Otto Alencar durante a sessão na CCJ.
O avanço da PEC reacende discussões antigas sobre modernização das relações de trabalho no Brasil. A mudança na jornada é vista por parlamentares como uma atualização necessária às dinâmicas sociais contemporâneas, que valorizam mais tempo de descanso, convivência familiar e saúde mental. A pressão da opinião pública, cada vez mais atenta a temas como burnout e equilíbrio entre vida pessoal e profissional, também tem repercutido no Congresso.
Do ponto de vista político, a PEC tornou-se mais uma frente de disputa interna, mas também um sinal de que o debate sobre direitos trabalhistas permanece central na agenda do país.

