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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta noite que o governo quer o Brasil em outro patamar, mas fez questão de ponderar que a "construção depois de anos de descompasso" não se faz de uma hora para outra.

"Você não vai resolver todos os problemas em um ano porque não encontramos nada normal", disse Haddad durante palestra para uma plateia de estudantes na Universidade de São Paulo (USP).
Contudo, o ministro voltou a afirmar que o Brasil tem chance grande de dar certo.
Ele deu como exemplo a economia do Rio Grande do Sul que, segundos os indicadores, reagiu em 60 dias. "Imaginávamos que a recuperação no Rio Grande do Sul fosse acontecer no ano que vem", admitiu o ministro que, mesmo depois de toda a sua defesa do arcabouço, não foi poupado por alunos, com cartazes com dizeres críticos ao dispositivo.
Equilíbrio das contas públicas
O ministro da Fazenda voltou a dizer que quando o atual governo assumiu o poder havia um grupo de pessoas que entendia que não se deveria levar em consideração o equilíbrio das contas públicas, e que essa seria uma questão menor.
"Não era isso que deve prevalecer, não é isso que deve orientar as ações de governo. Nós temos que passar por isso. Se for preciso fazer déficits crescentes, mas garantindo aquilo que foi defendido nas urnas, aquilo que nós representamos, vale a pena o risco de não equilibrar, não sinalizar uma atenção a isso, pelo menos no curto prazo", disse Haddad para estudantes da USP.
Para ele, de outro lado, tem pessoas que também têm legitimidade, embora ressaltando haver riscos concretos nesse desarranjo todo. E o desarranjo, segundo o ministro, não era pequeno.
"Nós não estávamos herdando uma situação de normalidade das finanças públicas. O Brasil nunca tinha dado calote em precatórios no plano federal, porque não faz sentido você poder pagar e mentir, dar um calote, a não ser para maquiar as contas públicas, como aconteceu", disse o ministro.
"Você não passa a mão no dinheiro dos governadores para baixar artificialmente o preço dos combustíveis durante as eleições. Você não destrói os cadastros dos programas sociais para oferecer benefícios a quem não precisa, com finalidades também eleitorais. Você não cria, mesmo com bons propósitos, um fundo de educação que foi turbinado. Eu criei o Fundeb lá atrás, em 2006, mas ele veio a ser turbinado recentemente. Você está jogando a conta para os governos futuros", acrescentou Haddad.
De acordo com ele, a gestão anterior terceirizou um governo fazendo com que as emendas parlamentares viessem a garantir uma base parlamentar.
"Eu não estou aqui nem criticando o Congresso. Ele está no papel dele de protagonismo. A questão é quando um Executivo fraco começa a delegar para outros poderes aquilo que é a sua decisão. Então, se você vai somando esses grandes eventos, você tem a dimensão do quadro", disse o ministro, acrescentando que o governo não vai frustrar a população - mas entende que a questão fiscal importa, sim, embora o quadro herdado tenha sido de descontrole das contas públicas.
Economia brasileira
Fernando Haddad, afirmou que o governo tem uma estratégia de enfrentar dois problemas que garante um ajuste fiscal não recessivo. Ele emendou que, em um trimestre, a economia brasileira cresceu o que o mercado financeiro projetou para um ano.
"Substituímos o teto de gastos por uma regra com mecanismos inovadores", disse Haddad, que não perdeu a oportunidade para voltar a denunciar que um conjunto de empresas se apropriou do orçamento público.
O ministro disse ainda que quando chegou na USP, onde profere agora palestra sobre os desafios da economia, viu um jovem portando um cartaz com os dizeres "Abaixo o arcabouço fiscal". Ele diz ter consciência de que o arcabouço poderia ser melhor do que é, mas que as pessoas desconectam a regra do que ela substituiu.
O ministro disse ainda que acordos importantes estão avançando com o Congresso para a economia brasileira seguir crescendo e citou os 3 milhões de postos de trabalho que foram criados.
"Vamos crescer mais de 6% em dois anos", disse Haddad, reforçando que o Brasil está em pleno emprego e a inflação caindo apesar dos choques
Transição dos governos
O ministro da Fazenda disse que a transição dos governos Bolsonaro para Lula da Silva, no campo econômico, foi uma experiência muito rica porque, em toda a sua complexidade, a economia não podia ser destacada do resto.
Não era, de acordo como ministro, apenas uma transição de governo, era algo que impunha alguns riscos que se tornaram patentes no dia 8 de janeiro do ano passado.
"Mas impõe ainda alguns riscos importantes de serem considerados, e nós estamos longe de ter superado uma situação de tensão social. Estamos longe disso. Então, a compreensão dessa transição pode nos ajudar no futuro próximo a não repetirmos os erros do passado recente, que nos levaram a uma situação muito delicada", disse Haddad, que neste momento profere a palestra intitulada "Os desafios da Economia e as Perspectivas da Política no Brasil" a alunos da USP, no Auditório István Jancsó da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, na Cidade Universitária.
Ainda, de acordo com ele, estamos em década muito delicada, e que é preciso entender que, às vezes, a economia não é simplesmente uma escolha do governante que foi eleito. "E nessa transição, o que estava em jogo era muito mais do que simplesmente determinar uma meta de inflação ou uma meta de superávit primário. Nós estamos falando de riscos institucionais, políticos e sociais muito relevantes, que tinham que ser considerados não apenas pelo presidente da República, mas pelos seus ministros. E o Ministério da Fazenda era uma peça-chave na engrenagem dessa transição", observou Haddad.
Para ele, foi preciso tomar os cuidados necessários para que o Brasil não descarrilhasse - e que, pelo contrário, entrasse nos eixos e permitisse, inclusive, ter uma situação e uma oposição saudáveis.
"Tudo que queremos é um governo saudável, e uma oposição saudável, que possa se apresentar com naturalidade e eventualmente ter uma alternância de poder que não coloque em risco valores tão caros a todos nós, como o valor da ciência, o valor da liberdade, o valor da democracia, o valor da fraternidade e da solidariedade", disse o ministro, acrescentando que esses valores têm que estar colocando no fundo de qualquer disputa.
"A disputa que não envolve esses valores, não deveria envolver esses valores. Mas quando a disputa passa a envolver esses valores, aí nós estamos correndo risco que nós não precisamos correr. Nós já vivemos vários períodos de exceção no Brasil", disse.
