1º Encontro Regional MIDIACOM MS
MINISTRO DA FAZENDA

Haddad diz que Lula está disposto a negociar com Trump, mas sem repetir postura de Bolsonaro

Ministro Fernando Haddad critica postura dos EUA, defende soberania brasileira e diz que governo prepara resposta sem retaliação às tarifas de 50%

29 julho 2025 - 17h30Flávia Said e Cícero Cotrim
Haddad tenta negociar até o último minuto
Haddad tenta negociar até o último minuto - (Foto: WILTON JUNIOR)

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta terça-feira (29) que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está aberto ao diálogo com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre o aumento de tarifas imposto ao Brasil, mas frisou que qualquer conversa deverá ser pautada pelo respeito mútuo. Segundo ele, Lula não aceitará ser tratado com desprezo, como já ocorreu com outros líderes internacionais.

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"Não dá para esperar que o presidente Lula se comporte como Bolsonaro, abanando o rabo, falando 'I love you' e batendo continência", declarou Haddad à CNN Brasil, em tom crítico à postura adotada pelo ex-presidente frente aos EUA. “Se houver uma conversa com Trump, temos que garantir que não será uma humilhação, como aconteceu com o presidente Zelensky na Casa Branca.”

As declarações ocorrem às vésperas da entrada em vigor do tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros, anunciado por Trump no início de julho e que passa a valer nesta sexta-feira, 1º de agosto. Para Haddad, ainda há espaço para negociação. “Estamos tentando desobstruir os canais, vagarosamente, mas estamos”, afirmou.

Governo prepara medidas para proteger economia brasileira

Desde que as tarifas foram anunciadas, o governo federal está elaborando um plano de contingência para proteger setores mais vulneráveis. Haddad, porém, preferiu não antecipar detalhes, alegando incertezas sobre os próximos passos da Casa Branca.

“Nem eles têm clareza sobre o que exatamente vai acontecer no dia 1º. Como vou anunciar uma medida diante de um ato que ainda desconhecemos?”, questionou o ministro. Segundo ele, o presidente Lula só vai decidir qual medida tomar após o início da vigência das tarifas.

O cardápio de opções inclui ações emergenciais e medidas estruturantes. Entre elas, está a possibilidade de conceder crédito facilitado, com juros baixos e carência, para empresas fortemente impactadas, semelhante ao que foi feito após a tragédia climática no Rio Grande do Sul, em 2024. "Algumas empresas vão precisar de apoio para se adaptar e buscar novos mercados", explicou Haddad.

Quatro ministérios lideram plano de reação

A resposta ao tarifaço está sendo coordenada por quatro ministérios: Fazenda, Casa Civil, Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e Relações Exteriores. Outras pastas, como Agricultura, também participam das discussões.

Grande parte das ações pode depender do aval do Congresso Nacional. Haddad afirmou acreditar que o Legislativo vai agir com responsabilidade. “O Congresso não vai se furtar a atender os setores atingidos. Seria até estranho negar apoio nesse momento”, disse. Segundo ele, há expectativa de consenso entre diferentes forças políticas.

Apesar do clima de tensão, Haddad descartou a adoção de medidas retaliatórias contra os Estados Unidos. Para ele, seria um erro repetir a estratégia americana. “O governo Trump pode estar dando um tiro no pé. Nós não podemos cometer o erro simétrico de encarecer produtos que ajudam a reduzir custos e aumentar a produtividade do Brasil”, disse.

As ações em análise, segundo ele, têm caráter de “proteção” e não de revanche. Todas respeitam as normas da Organização Mundial do Comércio (OMC) e seguem os padrões internacionais. “Lula saberá conduzir o processo com altivez e sobriedade, sem bravatas e sem submissão”, afirmou o ministro, acrescentando que a postura do atual presidente americano tem gerado dificuldades para vários países.

O governo brasileiro ainda busca compreender a real motivação por trás das novas tarifas americanas. Haddad revelou que há mais elementos na investigação comercial aberta pelos EUA do que os mencionados publicamente, e que o Brasil ainda não obteve respostas às provocações feitas até agora.

“Todo mundo está pisando em ovos. Nem eles sabem direito o que querem. Antes de conhecer a decisão definitiva do governo americano, não dá para antecipar nenhuma medida”, afirmou.

O ministro destacou que o governo Biden havia mantido diálogo constante com o Brasil, especialmente com a secretária do Tesouro, Janet Yellen. Com Trump, segundo Haddad, houve uma guinada. “Entre maio e julho, a postura dos EUA mudou completamente. O México e o Canadá estão sendo ainda mais afetados que o Brasil”, apontou.

Pix vira alvo de investigação, mas não será privatizado

Uma das frentes da investigação americana aponta para o Pix, sistema de pagamentos criado pelo Banco Central. Haddad garantiu que o governo não pretende privatizá-lo. “O Pix não concorre com ninguém. Se for privatizado, vai gerar custos e tarifas para algo que hoje é gratuito”, disse. O ministro acredita que esse item pode ter sido impulsionado por lobby de empresas como Visa e Mastercard.

Em tom crítico, Haddad acusou setores da oposição de “sabotar” as tentativas de diálogo em Washington, referindo-se à comissão de senadores que viajou aos EUA. Ele sugeriu que há parlamentares mais preocupados em agradar potências estrangeiras do que em defender o interesse nacional.

“Lutar contra o próprio país, se alinhar com interesses de uma economia cinco vezes maior, não faz sentido”, disparou.

O ministro negou que o governo esteja se aproveitando politicamente do conflito com os EUA e lembrou que a aprovação de Lula já vinha subindo antes do anúncio das tarifas, impulsionada por medidas como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais.

Haddad destacou que, ao contrário de México e Canadá, o Brasil tem uma pauta de exportações mais diversificada, o que pode ajudar a suavizar os efeitos do tarifaço. O país também vende menos para os EUA do que para outras regiões e mantém um déficit comercial com os americanos — fator que, segundo o ministro, torna desnecessária qualquer ação punitiva.

O acordo entre Mercosul e União Europeia, que segue avançando, é visto como uma alternativa para reequilibrar os impactos nas exportações brasileiras.

Haddad concluiu dizendo que, diante da crise, o governo vai agir com “cautela e sobriedade”. “Não podemos ser nem arrogantes, nem submissos”, afirmou.

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