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AUTONOMIA FINANCEIRA

Senado articula blindagem ao Pix após pressão dos EUA sobre sistema de pagamentos brasileiro

Emenda à PEC da autonomia do Banco Central quer garantir exclusividade do BC sobre o Pix e impedir interferência externa ou privatização

8 agosto 2025 - 07h00Célia Froufe e Cícero Cotrim
'Vou acatar tudo que seja bom para os brasileiros e para a modernização do BC', diz Plínio, em nota
'Vou acatar tudo que seja bom para os brasileiros e para a modernização do BC', diz Plínio, em nota - (Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado)

Diante da ofensiva do governo dos Estados Unidos contra o Pix, o Senado Federal se mobiliza para proteger o sistema de pagamentos brasileiro. O relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65, que trata da autonomia financeira e administrativa do Banco Central, senador Plínio Valério (PSDB-AM), incluiu uma emenda que blinda o Pix contra ingerências externas, privatizações e possíveis taxações. A medida foi construída em articulação com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), e deve ser apresentada oficialmente à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) na próxima semana.

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A iniciativa surge após o Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) anunciar, em 15 de julho, uma investigação sobre práticas consideradas "injustas" do Brasil no setor de pagamentos eletrônicos. Embora o termo “Pix” não seja mencionado diretamente no documento, a crítica envolve a preferência dada ao sistema desenvolvido pelo Banco Central, o que teria incomodado big techs americanas interessadas em operar nesse mercado.

A emenda apresentada por Plínio Valério busca garantir que o Banco Central mantenha o controle exclusivo sobre a infraestrutura do Pix, impedindo sua concessão ou transferência a qualquer ente público ou privado, especialmente em casos relacionados à segurança e combate a fraudes. Segundo o senador, a medida é essencial para proteger uma das maiores inovações do sistema financeiro brasileiro.

“A blindagem do Pix é fundamental e, com a participação do líder Jaques Wagner nessa emenda, conseguiremos o apoio necessário para aprová-la tanto na CCJ quanto no plenário o mais rápido possível”, afirmou Plínio, em nota. “Vou acatar tudo que seja bom para os brasileiros e para a modernização do BC”, completou.

A expectativa é de que o relatório final da PEC seja entregue à CCJ na sexta-feira da próxima semana, com votação marcada para o dia 20 de agosto.

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva também reagiu à movimentação dos EUA. Em declarações recentes, Lula classificou o Pix como “um patrimônio do nosso povo” e ressaltou que o sistema é do Brasil. A crítica americana à suposta “prática desleal” do país no setor de pagamentos é vista como uma tentativa de favorecer empresas estrangeiras, que não conseguiram ocupar espaço no mercado dominado pelo Pix, gratuito para pessoas físicas e amplamente utilizado em todo o território nacional.

Mesmo sem menção direta ao Pix, o relatório do USTR cita “vantagens para serviços de pagamento eletrônico desenvolvidos pelo governo”, o que foi interpretado por autoridades brasileiras como uma referência clara ao sistema do Banco Central.

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, tem sido um dos principais defensores da PEC 65. Em sua avaliação, a autonomia orçamentária do BC é um passo fundamental para garantir o funcionamento e a modernização da autoridade monetária. Em audiência na quarta-feira (6), Galípolo destacou o Pix como símbolo da eficiência pública no setor financeiro e defendeu que sua estrutura permaneça como uma infraestrutura pública.

“O êxito do Pix decorre da excelência técnica do Banco Central, que garante a universalidade de acesso e provê as infraestruturas tecnológicas necessárias ao sistema a custo baixo, assegurando seu funcionamento eficiente, seguro e equitativo”, afirmou Plínio Valério na justificativa da emenda.

No entanto, dentro do próprio governo há pontos de discordância em relação à PEC. Um dos principais impasses é sobre quem será o responsável por acompanhar e regular o orçamento do Banco Central. Enquanto a proposta atual indica a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o governo insiste que essa função deve permanecer com o Conselho Monetário Nacional (CMN). Outro ponto de tensão é a possibilidade de liberação de salários acima do teto constitucional para servidores da autarquia, o que poderia gerar um efeito cascata em outras carreiras públicas e representar uma ameaça ao controle fiscal.

Desde seu lançamento em 2020, o Pix se tornou um dos maiores casos de sucesso do setor público brasileiro. Hoje, o sistema é utilizado por mais de 150 milhões de pessoas e já responde por mais de 30% das transações financeiras no país. A gratuidade para pessoas físicas e a possibilidade de uso por meio de diferentes tipos de contas bancárias garantem inclusão financeira para camadas da população antes marginalizadas pelo sistema bancário tradicional.

“O Pix rompeu barreiras históricas de acesso a meios de pagamento eletrônicos”, afirmou Plínio Valério. “Seu sucesso prova que é possível desenvolver tecnologias públicas de alta qualidade, com eficiência, segurança e baixo custo para a população.”

A PEC 65, com a emenda de proteção ao Pix, avança num contexto de crescente valorização da soberania digital e tecnológica do Brasil. Se aprovada, a proposta consolidará o Banco Central como único operador do sistema, preservando o caráter público da inovação e respondendo diretamente à pressão externa de interesses privados internacionais.

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