
Era mais uma sexta-feira de setembro, com os mercados aparentemente em sua habitual dança de sobe e desce. Mas algo diferente estava no ar. O dólar, que vem sendo o protagonista em 2024, perdeu parte do brilho, ao menos por um dia, diante da expectativa de que o Federal Reserve (o banco central norte-americano, para os mais íntimos, "Fed") pode estar a ponto de afrouxar sua política monetária de forma mais intensa do que se esperava. E isso, acredite, faz toda a diferença para o mundo inteiro – inclusive para nós, brasileiros.

Entre as moedas de países emergentes, o real aproveitou o embalo e foi a segunda mais valorizada do dia, ficando atrás apenas do peso mexicano. No fim do pregão, o dólar caiu 0,91%, sendo negociado a R$ 5,5673. Foi uma semana de baixa para a moeda norte-americana, que também acumula queda de 1,20% em setembro. No entanto, no acumulado do ano, a situação é outra: o dólar ainda se valoriza 14,71%. Resumindo: o real ganhou fôlego, mas não tanto a ponto de reverter a trajetória de alta da moeda americana em 2024.
O que o Fed tem a ver com isso? Para quem não está muito por dentro, o Fed é o banco central dos Estados Unidos, e suas decisões sobre taxas de juros mexem com a economia global. Juros mais altos nos EUA significam que os investidores preferem deixar o dinheiro por lá, já que ganham mais com menos risco. Juros mais baixos fazem o contrário: o dinheiro "foge" em busca de melhores rendimentos em países como o Brasil, que oferecem retornos maiores, mas com mais risco. E é aí que entra a movimentação da última semana.
Na véspera da próxima reunião de política monetária do Fed, uma reportagem do Wall Street Journal jogou no ar uma dúvida crucial: o Fed vai cortar os juros, mas será que vai cortar muito ou pouco? O mercado financeiro, que adora antecipar as coisas, logo começou a fazer contas. Alguns analistas apostam num corte de 50 pontos-base (meio ponto percentual), enquanto outros acreditam num corte mais modesto, de 25 pontos-base. A incerteza mexeu com todo mundo.
Para apimentar a situação, o ex-presidente do Fed de Nova York, Bill Dudley, saiu em defesa de um corte mais agressivo. Isso bastou para que o mercado revisse suas apostas. O site do CME Group, que é uma espécie de termômetro das expectativas financeiras, agora aponta que há 50% de chance de que o corte seja de 50 pontos-base. Se isso acontecer, os juros nos EUA caem mais rápido, e países como o Brasil podem se beneficiar dessa injeção de ânimo nos mercados emergentes.
Mas o que isso tem a ver com o real? É simples: juros menores nos Estados Unidos tiram parte do brilho dos investimentos por lá, e o dinheiro acaba indo parar em lugares onde o retorno pode ser maior – como no Brasil. O economista Luciano Costa, da corretora Monte Bravo, foi direto ao ponto: "A percepção dovish em relação ao Fed comanda tudo", disse ele, usando o jargão financeiro para se referir a uma expectativa de afrouxamento na política monetária dos EUA. Para quem não está familiarizado, "dovish" é o oposto de "hawkish" (agressivo, restritivo). Ou seja, o mercado acredita que o Fed vai suavizar sua postura, e isso impulsiona o apetite por ativos de maior risco, como o real.
Esse cenário de juros mais baixos lá fora fez com que as taxas dos títulos do Tesouro americano – os "Treasuries" – também caíssem, o que foi música para os ouvidos de quem aposta em moedas de países emergentes. Com menos retorno nos Estados Unidos, os investidores vão atrás de oportunidades em mercados como o Brasil, onde, apesar das incertezas, o retorno pode ser mais interessante.
Um real mais forte, mas por quanto tempo? Embora o real tenha ganhado um pouco de tração nesta semana, o futuro ainda é incerto. A moeda brasileira se valorizou em parte porque os investidores enxergam oportunidades por aqui. Mas o real também recebeu uma ajudinha das commodities, que, por um tempo, sustentaram sua valorização. Só que até nisso houve um revés. O petróleo, por exemplo, fechou em queda, em parte por causa do impacto de um fenômeno climático chamado "Francine", que ameaça a produção no Golfo do México. O minério de ferro, outro pilar do mercado de commodities, também caiu.
O que parece claro é que, mesmo com essa pequena vitória do real sobre o dólar, a moeda norte-americana continua sendo a grande estrela do ano. O BTG Pactual divulgou uma pesquisa nesta sexta-feira que aponta para um cenário de moderada valorização do real, mas sem grandes euforias. Cerca de 44% dos entrevistados esperam que o dólar fique entre R$ 5,20 e R$ 5,40 nos próximos 12 meses, enquanto 28% acreditam que a cotação ficará um pouco mais alta, entre R$ 5,40 e R$ 5,60.
E agora, o que esperar? Por enquanto, o mercado está com os olhos cravados na próxima decisão do Fed. Se o banco central americano realmente decidir cortar os juros de maneira agressiva, poderemos ver um fluxo ainda maior de dinheiro para países como o Brasil, o que tende a fortalecer o real. Mas nada é certo. A economia global continua cheia de variáveis imprevisíveis, e o comportamento do dólar nos próximos meses dependerá não só do que acontece nos Estados Unidos, mas também das tensões políticas e econômicas dentro do Brasil e do desempenho das commodities no cenário internacional.
Por enquanto, o real conseguiu um respiro. Mas, como sempre, no mundo financeiro, o que sobe também pode descer.
