
Com o avanço do acesso a produtos financeiros globais, um novo desafio se impõe ao mercado brasileiro: preparar seus profissionais para falar com propriedade sobre investimentos no exterior. A constatação, que circula entre executivos e instituições, foi reforçada durante evento da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), em São Paulo, no início de novembro.
A movimentação reflete um desejo crescente por parte de investidores e assessores da chamada “Faria Lima” em diversificar os portfólios para fora do Brasil. Mas, se a tecnologia abriu portas para acessar mercados internacionais, o conhecimento técnico — especialmente sobre tributação, sucessão patrimonial e riscos geopolíticos — ainda precisa ser ampliado.
“A carteira do brasileiro ainda é muito concentrada no mercado local, mas percebemos uma mudança. A barreira estrutural vem diminuindo, e agora o desafio é educar o profissional e o cliente”, afirma Marcelo Billi, superintendente de Sustentabilidade, Inovação e Educação da Anbima.
Certificação gratuita para quem quer aprender mais - Para acelerar esse processo de formação, a entidade lançou recentemente uma microcertificação voltada exclusivamente para investimentos internacionais. Gratuita e aberta ao público, a trilha de aprendizagem tem cerca de três horas e está disponível na plataforma Anbima Edu. “Percebemos que o tema cresceu muito e os profissionais estavam sendo cada vez mais cobrados. Decidimos, então, ir além do que é exigido nos exames tradicionais”, diz Billi.
A intenção da Anbima é impulsionar o preparo técnico dos profissionais e, assim, contribuir para o amadurecimento de uma cultura de diversificação. “O brasileiro está mais atento aos impactos internacionais na sua vida financeira, seja no consumo, nas viagens ou nas variações cambiais”, explica o executivo.
Estratégias para não ficar para trás - A Avenue, uma das plataformas especializadas em acesso ao mercado americano, também aposta na educação como ferramenta-chave. “Quem não estiver pronto para falar sobre investimentos no exterior, vai ficar para trás”, alerta Juliana Benvenuto, coordenadora de Alocação e Inteligência da corretora.
Desde 2022, a Avenue realiza treinamentos contínuos com parceiros, com conteúdos sobre estrutura de mercado, planejamento tributário internacional e sucessão patrimonial. Em 2024, foram mais de 350 sessões ao vivo.
O BTG Pactual, por sua vez, aposta em uma abordagem de longo prazo. A capacitação dos assessores é feita pela universidade corporativa interna BTG Bankers, com vídeos, trilhas de conhecimento e materiais de apoio. Segundo Victor Ferreira, head de Capacitação, a empresa está preparando uma certificação específica em conteúdo offshore para lançamento em 2026.
“Queremos que o processo de aprendizado seja contínuo, e não algo pontual”, afirma Ferreira.
Treinamentos internacionais e imersões - Algumas instituições vão além da sala de aula. O BTG levou assessores para treinamentos em instituições renomadas como a Universidade de Columbia e a Wharton School, nos Estados Unidos. A Monte Bravo fez algo semelhante, com imersões no Disney Institute e eventos no Brasil com profissionais globais como David Richman, referência internacional na formação de consultores financeiros.
“Capacitação virou parte do nosso DNA. Hoje, tratamos sobre o mercado offshore em toda reunião semanal”, afirma Felipe Carbonar, diretor comercial da Monte Bravo. Atualmente, cerca de 15% dos R$ 45 bilhões sob custódia da corretora estão aplicados fora do Brasil. A meta é elevar esse índice para até 25%.
Oferta em alta, conhecimento precisa acompanhar - Com a democratização das plataformas, investir no exterior deixou de ser privilégio dos super-ricos. Hoje, mesmo com aportes menores, já é possível acessar ações, ETFs, títulos e fundos internacionais. A oferta se expandiu — e com ela, a responsabilidade dos profissionais de saber explicar riscos, prazos, e estratégias adequadas ao perfil de cada cliente.
A corrida por capacitação mostra que o mercado financeiro brasileiro começa a entender que internacionalizar a carteira exige mais do que uma plataforma tecnológica — exige preparo, estudo e uma mudança cultural em curso.

