
Por ampla maioria de 436 votos a 2, a Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta terça-feira (9), o projeto de lei complementar que cria novas regras para combater a sonegação fiscal e punir os chamados “devedores contumazes” — empresas que deixam de pagar tributos de forma intencional, reiterada e injustificada.
De autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o Projeto de Lei Complementar (PLP) 125/2022 segue agora para sanção do presidente Lula, já que o texto aprovado pelos deputados é idêntico ao que foi validado por unanimidade no Senado, sob relatoria do senador Efraim Filho (União-PB).
A proposta visa desarticular estruturas que usam a inadimplência como estratégia de negócio e ganhou impulso após as revelações da Operação Carbono Oculto, que identificou atuação do crime organizado, como o PCC, no setor de combustíveis e lavagem de dinheiro via fundos de investimento.
Segundo o texto, será classificado como devedor contumaz o contribuinte com dívida tributária injustificada igual ou superior a R$ 15 milhões e que ultrapasse 100% do seu patrimônio conhecido. O critério também exige reincidência: inadimplência por quatro períodos seguidos ou seis alternados em um ano.
Nos âmbitos estadual e municipal, os valores mínimos e critérios poderão ser definidos pelos próprios entes federados. Caso não o façam, valerão as regras federais. Situações excepcionais, como calamidades públicas, impedem a aplicação dessa classificação.
As empresas consideradas devedoras contumazes podem sofrer penalidades severas:
- Baixa do CNPJ, se comprovado conluio ou fraude;
- Proibição de usar benefícios fiscais;
- Proibição de participar de licitações ou manter contratos com o poder público;
- Impedimento de entrar com pedido de recuperação judicial;
- Classificação como inaptas no cadastro fiscal.
Um dos pontos centrais do projeto é impedir a extinção da responsabilidade penal com o simples pagamento da dívida. Ou seja, devedores contumazes não poderão evitar punição criminal apenas quitando os débitos após serem autuados.
A Receita Federal ficará responsável por listar os devedores contumazes em seu site. As administrações estaduais e municipais também deverão divulgar essas informações e notificar o Ministério da Fazenda sobre inclusões e exclusões desses contribuintes.
Aprovado em meio às descobertas da Carbono Oculto, o texto obriga a Agência Nacional do Petróleo (ANP) a adotar critérios mais rígidos no setor de combustíveis. Entre eles:
- Exigência de comprovação de origem lícita dos recursos;
- Identificação dos sócios reais das empresas;
- Capital social mínimo de R$ 1 milhão para revendedores, R$ 10 milhões para distribuidoras e R$ 200 milhões para produtoras.
A medida busca evitar o uso de “laranjas” e dificultar a entrada de organizações criminosas no setor.
O texto também obriga instituições de pagamento, como fintechs, a seguir regras do Poder Executivo para ampliar o controle sobre transações financeiras e prevenir lavagem de dinheiro.
O projeto cria três programas de conformidade fiscal:
- Confia – Conformidade Cooperativa Fiscal;
- Sintonia – Estímulo à Conformidade Tributária;
- OEA – Operador Econômico Autorizado.
Empresas que aderirem terão benefícios como tratamento diferenciado, facilidades para regularização e redução de juros, além de autorregularização facilitada em caso de crise financeira.
Outra inovação do projeto é a criação de um conjunto de normas para equilibrar os direitos e deveres dos contribuintes, com foco em reduzir disputas judiciais e facilitar o cumprimento das obrigações fiscais.
Entre os deveres dos órgãos tributários estão: reduzir processos administrativos, eliminar taxas indevidas e priorizar a resolução cooperativa dos conflitos fiscais.
Apesar do consenso entre os partidos — todos orientaram favoravelmente — a votação ocorreu em clima tenso, após protesto e expulsão do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) do plenário, que ocupa a cadeira da presidência da Casa em protesto contra um processo no Conselho de Ética.
Mesmo assim, a proposta foi aprovada com apenas dois votos contrários, dos deputados Marx Beltrão (PP-AL) e Flávio Nogueira (PT-PI). O presidente da Câmara, por regra, não vota.

