
Em um momento crítico do ano para os riscos de queimadas, produtores rurais de São Gabriel do Oeste, a 140 km de Campo Grande, vêm liderando uma das maiores frentes de combate a incêndios florestais do Estado. A ação, que ganhou forma por meio da união espontânea de agricultores e seus colaboradores, é hoje coordenada institucionalmente pelo Sindicato Rural da cidade, presidido por Renê Miranda.

“A iniciativa partiu dos próprios produtores e seus times, não do sindicato. Nosso papel é dar suporte, articular com Corpo de Bombeiros, Prefeitura e demais órgãos. Mas o mérito é totalmente do campo”, destaca Miranda, em entrevista ao Giro Estadual de Notícias nesta segunda-feira (22).
A brigada rural nasceu no Chapadão de São Gabriel, região de intensa produção agrícola, com um objetivo claro: prevenir focos de incêndio antes que se tornem tragédias ambientais. “A força da nossa terra é a garra do nosso povo. Ninguém quer ver o solo que levou anos para ser estruturado virar cinzas”, disse o presidente do sindicato.
Presidente Renê Miranda apresenta o projeto 'Agro que Preserva Contra o Fogo', que busca unir forças no enfrentamento aos incêndios
Segundo Miranda, a agricultura moderna exige investimentos pesados em estrutura do solo – desde a superfície até 40 centímetros de profundidade – com correções, adubações e recomposição da microbiota, essencial para a produtividade de culturas como soja, milho e pastagem. “Um foco de incêndio destrói tudo isso. O prejuízo é imediato e prolongado. As áreas queimadas produzem até 20 sacas a menos por hectare”, alerta.
Uma brigada exemplar - A brigada formada em São Gabriel do Oeste é tida como uma das mais bem estruturadas do estado. Conta com caminhões-pipa, carretas de reabastecimento, uniportes adaptados e tratores especializados para combate ao fogo. Tudo organizado em microrregiões de monitoramento, com grupos de alerta rápido e comunicação ágil. “Se alguém vê fumaça, mesmo que seja poeira de calcário, já investiga. É tudo muito coordenado”, relata.
Renê destaca ainda que as ações não se limitam às fronteiras municipais. A brigada atua também em áreas de Bandeirantes, Rio Negro, Rio Verde e Camapuã. “Aqui não existe limite geográfico. O fogo não respeita município, então nosso combate também não”, afirma.
A estrutura do projeto foi fortalecida com apoio do Corpo de Bombeiros Militar do Estado. “Buscamos orientação técnica para agir corretamente e, desde então, essa parceria tem sido fundamental”, conta Miranda.
Apesar dos avanços, o presidente do sindicato aponta entraves causados pela burocracia e por uma legislação ambiental ultrapassada. “Temos projetos excelentes que esbarram em regras antigas, que não acompanham o dinamismo da iniciativa privada. O poder público precisa entender que estamos salvando vidas e o meio ambiente”, pontua.
Dois projetos importantes estão sendo trabalhados pela equipe de Renê Miranda. O primeiro é o Agro que Preserva Contra o Fogo, que propõe a subdivisão de áreas de morraria em quadrantes menores, facilitando o acesso e permitindo ações seguras de combate ao fogo. O outro é o Vitrine 163, voltado à proteção das margens da BR-163, onde o risco de incêndios causados por acidentes de trânsito é alto.
“Recentemente, um caminhão com carga de algodão incendiou uma grande área agrícola às margens da rodovia. As imagens são impressionantes. Precisamos de soluções para isso”, defende. Segundo ele, áreas com alto fluxo de veículos não devem ter vegetação nas faixas de domínio. “A margem da rodovia precisa ser uma válvula de escape, não uma armadilha”, afirma.
Presidente do Sindicato Rural de São Gabriel do Oeste, Renê Miranda, acompanha de perto as ações da brigada contra incêndios rurais
A importância do produtor rural no cuidado com o meio ambiente - Renê Miranda fez questão de rebater críticas que apontam o setor agropecuário como vilão dos incêndios. “Com raras exceções, produtor nenhum coloca fogo no próprio patrimônio. Queimadas comprometem colheitas, exigem reinvestimento em solo e levam anos para serem reparadas”, ressalta.
Ele reforça que a ação contra incêndios é coletiva, envolvendo produtores, colaboradores, bombeiros e até concessionárias de energia elétrica. “A Energisa, por exemplo, melhorou muito após nossa cobrança. Hoje há menos riscos de faíscas em redes”, diz.
O presidente do sindicato reconhece que o modelo criado em São Gabriel do Oeste pode ser replicado em outras regiões do Brasil, especialmente em estados com forte vocação agrícola. Mas, para isso, é necessário apoio institucional, desburocratização e sensibilidade dos órgãos ambientais.
“Se tivesse uma receita pronta, incêndios não estariam destruindo florestas nos Estados Unidos, na Austrália ou na Europa. Precisamos de ações adaptadas à nossa realidade e mais diálogo com quem está no campo”, conclui.
O objetivo é iniciar oficialmente a implantação dos projetos em 2026, com apoio de entidades como Polícia Rodoviária Federal, IBAMA, DNIT, AGETRAN, CCR e Crea-MS. “Queremos mostrar à população urbana que o produtor se preocupa, sim. E que estamos dispostos a fazer o que for necessário para preservar o meio ambiente e a vida humana”, finaliza. Confira a entrevista na íntegra:
