
Breves apontamentos sobre o processo de Jesus Cristo

O calendário cristão recorda hoje a paixão de Jesus Cristo, preso, humilhado, açoitado, torturado e morto num célere processo conduzido ao arrepio da lei da época.
Anotam os estudiosos do processo de Jesus Cristo, a partir de convergentes relatos dos evangelistas Mateus, Marcos e Lucas, que, delatado por Judas, Jesus foi preso à noite, sem que ninguém apontasse a ele o crime que teria cometido, embora a lei mosaica exigisse prévia ata formal de acusação e não permitisse que nenhum processo fosse iniciado durante a noite.
Após a prisão, Jesus foi levado à presença do religioso Anás, autoridade incompetente para julgá-lo, que, todavia, assumiu o processo, passando a defender a aplicação da pena capital ao Nazareno.
Ao longo do processo, e como não havia qualquer testemunho idôneo e imparcial, a acusação variou entre profanação do sábado, que não era punida com a pena de morte, blasfêmia, traição e lesa majestade, estas sim apenadas com a pena capital.
De Anás, o processo seguiu para o sumo sacerdote Caifás, até se encerrar, nessa primeira etapa, a que denominamos religiosa, no Grande Sinédrio, uma espécie de conselho composto por sacerdotes, que decidiu unanimemente pela pena de morte.
Em seguida, já na segunda etapa, entregaram Jesus à autoridade de Pôncios Pilatos, pró cônsul romano e governador da Judeia, que hesitava em condenar Jesus, tendo dito expressamente não encontrar nenhum crime naquele homem.
Mesmo assim, tendo os acusadores relatado que Jesus instigava o povo desde a Galileia, Pôncio Pilatos entregou Jesus à Herodes, que reinava na Galileia e se encontrava em Jerusalém para os festejos da Páscoa.
Não tendo conseguido levar a cabo a condenação popular do Cristo, Herodes o remeteu novamente à autoridade de Pôncio Pilatos, que, apesar de não ver “nenhum crime digno de morte a ser julgado, impõe a Ele flagelos físicos terríveis com o intento de aplacar a sanha das autoridades judaicas e do povo por eles insuflado”[1], não sem antes dizer “após isso, o soltarei” (Lc 23, 16).
Após os flagelos, convencido da inocência do acusado, Pilatos propõe ao povo a substituição de Jesus por Barrabás, acusado de saques e assassinato, tendo a multidão, ensandecida e insuflada pelas autoridades religiosas, optado por salvar Barrabás.
“O que farei de Jesus, que se chama o Cristo?”, perguntou Pilatos, conforme Mateus 27:22. E a multidão, instigada pelos sacerdotes e fariseus, respondeu: “Crucifique-o”.
Pilatos, receoso das consequências de contrariar os interesses dos poderosos e da massa ignara, lava as mãos, afirmando não ser culpado do derramamento de sangue daquele homem que considerava inocente e entrando para a história como exemplo maior de um juiz covarde.
Jesus Cristo é imolado na Cruz.
A história do seu processo deixa à humanidade um roteiro que jamais deveria se repetir, mas que, infelizmente, tem sido seguido à risca em alguns julgamentos humanos, conduzidos por acusadores que, visando interesses pessoais e corporativos, conduzem-se com hipocrisia e demagogia para atrair o apoio da opinião pública, como que a considerar que haverá sempre um Pôncio Pilatos pelo caminho, a julgar com medo de desagradar os estamentos do poder e a multidão ensandecida.
Mais do que isso, com sua vida e morte, o Mestre legou ao mundo uma doutrina centrada no amor, na compaixão, no respeito às diferenças e na consciência de que o ser humano é falível e imperfeito, e a humanidade uma grande família, que deve se abraçar e se ajudar mutuamente, sem muros que separem povos, armas e gestos que produzam guerras e todo tipo de violência.
Que lembremos a doutrina do Mestre, mas que, acima de tudo, coloquemos o seu exemplo em prática, hoje e sempre.
*O Autor, José Belga Assis Trad, advogado, pós graduado em direito penal econômico pelo IBCCRIM-Coimbra, e pós-graduando em Direito Penal e Criminologia pela PUC-RS.
[1] Apud Marco Aurélio Bezerra de Mello, Os Grandes Julgamentos da História.
