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ISOLAMENTO

Em SP, cerca de 1 milhão vive em casas superlotadas, um desafio ao isolamento

Os dados foram compilados pelo Estado com base na Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e se referem a 2018

30 março 2020 - 11h00
Em números absolutos, 11,6 milhões de brasileiros dividem o quarto com pelo menos três pessoas.
Em números absolutos, 11,6 milhões de brasileiros dividem o quarto com pelo menos três pessoas. - Foto: Divulgação
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Em São Paulo, pouco mais de 1 milhão mora em locais superlotados, com mais de três pessoas por dormitório. Isso dificulta a implementação de medidas de isolamento para pacientes diagnosticados com a covid-19 e deve acelerar a transmissão do coronavírus nesses lugares. Os dados foram compilados pelo Estado com base na Síntese de Indicadores Sociais (SIS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e se referem a 2018.

A média da cidade, que tem 8,3% da população vivendo nessas condições, é bem mais alta que a do Brasil. No País, 5,6% dos cidadãos moram em residências com adensamento populacional excessivo. Em números absolutos, 11,6 milhões de brasileiros dividem o quarto com pelo menos três pessoas.

O excesso de pessoas na residência é uma barreira ao isolamento. O infectologista Jamal Suleiman, do Instituto Emílio Ribas, explica que, quando alguém é infectado pelo vírus, deve preferencialmente restringir a circulação dentro da própria casa, o que significa permanecer em um cômodo isolado. "A higienização do espaço deve ser feita pelo próprio paciente ou, quando não houver essa possibilidade, sob demanda."

Na casa de Suderlene da Cruz, de 42 anos, isso é praticamente impossível. Hoje, ela divide a casa com o marido e dois filhos. Anteriormente já foi pior, confessa. A pequena residência na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte de São Paulo, já abrigou outros três filhos.

Um lençol divide o único quarto da residência ao meio. De um lado, dorme Suderlene e o marido Advaldo Rosa, de 46 anos. Do outro, a filha mais nova, Jhessy Keith, de 15 anos. Jefferson Kelvin, de 20, dorme na sala. O banheiro da casa fica ao lado do quarto. "Não dá para isolar ninguém em um lugar só, senão alguém fica sem banheiro", conta Suderlene.

Na casa de Francisco Chaves Filho, de 57 anos, o problema se repete. O morador de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, divide a casa com três filhos e quatro netos. "Ficamos todos um pertinho do outro. Não dá para fazer nada."

Neste caso, quando medidas de isolamento são inviáveis, a recomendação do especialista, em caso de suspeita ou confirmação de infecção por coronavírus, é reforçar a higiene. "Superfícies, banheiros e pisos devem receber uma solução de água sanitária com água na proporção um para oito. Essas pessoas também não devem compartilhar objetos de uso pessoal", aconselha Suleiman. Ele afirma que o vaso sanitário também deve ser limpo cuidadosamente com a solução de água sanitária e lavar as mãos é de extrema relevância.

A família de Suderlene já aumentou os cuidados com a limpeza e segue as recomendações que vê nos jornais. Quando o filho e o marido chegam do trabalho, lavam as mãos antes mesmo de entrar em casa. Para isso, o tanque localizado na parte externa da residência já está preparado com sabão e álcool - o líquido, porque álcool em gel é considerado item de luxo.

Para Francisco, porém, com a família inteira desempregada, não sobra dinheiro para comprar sabão e álcool em gel. Muitas vezes a higiene é feita só com água e em outros momentos até isso falta. "Tem vezes que ficamos um dia inteiro sem água na torneira", conta.

Rotina

Com tantas dificuldades para conter a disseminação do vírus, o jeito é mantê-lo afastado. A forma mais eficaz que as famílias de Suderlene e Francisco encontraram para fazer isso é alterar um pouco a rotina e evitar ao máximo sair de casa. Uma pesquisa do instituto Data Favela divulgada nesta semana mostra que 97% dos moradores de áreas mais pobres já mudaram o cotidiano.

Suderlene, o marido e os filhos restringiram os passeios e saem apenas quando é necessário. "Faz duas semanas que não coloco o pé para fora do portão", confessa. Para ela, que vive de faxinas diárias e não tem carteira assinada, isso significa ficar sem salário.

Advaldo, que é porteiro, segue trabalhando, pois seu serviço é considerado essencial. Suderlene revela que tem medo de ele contrair o vírus no emprego ou no trajeto do trabalho. E tira seu sono a incerteza em relação ao salário do marido. "Já falaram que talvez ele não receba porque o pessoal não está querendo pagar a taxa do condomínio", conta. O coração da faxineira também aperta quando vê o filho Jefferson saindo para trabalhar. "Fico apavorada porque ele só tem 20 anos."

Na casa de Francisco, o vírus trouxe desemprego. Uma de suas filhas, que trabalhava com organização de festas, foi dispensada porque já não se fazem mais eventos. "Estamos todos parados, não tem ninguém recebendo. Assim fica difícil de combater essa praga." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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